sexta-feira, 20 de abril de 2012

Sem dinheiro para estudar


A minha crónica semana no Jornal Torrejano.


A SIC, na passada segunda-feira, transmitiu um trabalho sobre o abandono da Universidade por parte de alunos sem rendimentos. A reportagem é um retrato fiel do país e dos profundos equívocos das políticas educativas seguidas a partir dos anos noventa do século passado, senão mesmo antes. Descobri que a justiça social em Portugal não decorre da responsabilidade jurídica individual, mas de concepções metafísicas que definem as maldições como hereditárias. Jovens estudantes, maiores de idade, cujos pais tenham dívidas à segurança social não são ilegíveis para receber bolsa de estudo. Se a Constituição da República não justificar este procedimento, certamente que a Bíblia o fará: Deus, assim dizem, reserva para os filhos o castigo do pai (Jó 21:19).

O pitoresco deste caso, todavia, não deve ofuscar o essencial da reportagem. Há um processo de elitização social – não intelectual – da Universidade. Jovens oriundos de famílias com poucos recursos terão cada vez mais dificuldade em estudar. A restrição alarga-se às classes médias fustigadas pela crise e pelas políticas governativas. O governo está a responder, através da selecção económica e social, a um problema real, o da incapacidade do tecido empresarial absorver os jovens com formação superior. Esta forma política de agir – iníqua e preguiçosa – resolve um problema não pela compensação do mérito, mas pela humilhação dos mais pobres e das classes médias em queda. Se o caminho da Universidade for o da redução do número de alunos, a selecção destes deverá ser feita apenas pelo mérito, havendo mecanismos sérios para ajudar estudantes sem recursos. De fora, deverão ficar aqueles que manifestem menos capacidades para o ensino superior e não os alunos pobres.

A iniquidade política do processo tem outra face. Muitos dos cursos existentes são absolutamente irrelevantes do ponto de vista profissional e cultural. Foram o resultado de  estratégias seguidas pelas instituições de ensino superior para captar alunos e sustentar os seus corpos docentes. A maioria dos alunos da reportagem da SIC frequentava cursos deste tipo. Se os recursos públicos são escassos, o Estado deveria ter há muito estabelecido regras muito rigorosas no reconhecimento de cursos e no número de vagas. Demitiu-se. Muito gente sabia que uma catástrofe se aproximava, mas a irresponsabilidade política deixou o processo decorrer até ao descalabro actual: licenciados sem trabalho e alunos sem dinheiro para estudar. 

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