segunda-feira, 20 de agosto de 2012

O retorno do destino

Luigi Russolo - Dinamismo en un automóvil (1911)

Contrariamente às sociedades tradicionais, o que marca a sociedade moderna - ou pós-moderna - é a aceleração do tempo. Não do tempo cosmológico, o qual continua regido por uma ordem de forças sobre as quais o homem não tem poder. O domínio que, a partir da filosofia cartesiana, o homem exerce, através da reflexividade, sobre si mesmo e o desenvolvimento da técnica desencadearam um conjunto de imperativos sociais cujo núcleo central é a rapidez. Cada vez mais depressa é o lema que conduz a vida nas sociedades actuais. A Internet é o último símbolo desse modo de vida, o lugar onde tudo se faz instantaneamente (ou quase). A própria economia entrou, na sua dimensão financeira, no domínio das transacções instantâneas. Os mercados agem e reagem instantaneamente. 

O problema não está apenas no facto de os seres humanos, por atléticos que sejam, não conseguirem viver à velocidade das luz ou coisa semelhante. Entre o imperativo social da velocidade elevada ao paroxismo e as capacidades da espécie humana há um abismo, cuja tendência é de se alargar infinitamente. Mas o principal reside na irracionalidade da instantaneidade. A razão, no seu uso quotidiano e aplicada ao mundo, é de natureza discursiva, isto é, ela não é intuitiva, não é imediata como, por exemplo, uma sensação. A razão implica sempre um percurso, que é o caminho que o raciocínio deve fazer na ligação entre premissas e conclusão. A razão implica o tempo e não opera na instantaneidade. Caminhar para a instantaneidade, mesmo que seja apenas em algumas dimensões da existência humana, é caminhar para a mais selvagem das irracionalidades, é criar ambientes pura e simplesmente caóticos onde o que ocorre é fruto não do saber mas do acaso ou, numa linguagem antiga, do destino.

4 comentários:

  1. Caro JCM,
    Neste tempo de não ter tempo, quer-me parecer que o destino vai continuar offline.

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    1. Offline, o destino propício, mas o outro parece cair inexorável sobre os homens.

      Abraço

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  2. "4. Noi affermiamo che la magnificenza del mondo si è arricchita di una bellezza nuova: la bellezza della velocità. Un automobile da corsa col suo cofano adorno di grossi tubi simili a serpenti dall'alito esplosivo... un automobile ruggente, che sembra correre sulla mitraglia, è più bello della Vittoria di Samotracia."
    Marinetti
    1909 Manifesto Futurista
    Esperando que a crise trave a velocidade, é que de tanto correr à roda da terra, estamos todos um pouco tontos e incapazes de pensar sobre o agir.
    Ratinhos de laboratório iludidos com a velocidade inconsequente da roda da pequena jaula.
    Boa Noite.

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    1. Seria interessante pensar a relação do futurismo italiano com o fascismo, coisa de sobejo conhecida, e com o actual estado de coisas, coisa menos conhecida.

      Boa tarde

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