quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Suspender a lei

Francisco de Goya - Sueño de la mentira y la inconstancia (1797-99)

O que é interessante em tudo isto é a falta de pudor. O deputado Frasquilho, homem forte dentro do PSD, acha que este aumento de impostos, o maior de que há memória, não está na matriz ideológica do partido, mas que este vai aprovar o orçamento de Estado por uma questão de interesse nacional. O grau de cinismo desta gente é desmedido. Estão a dizer que a política que fazem - que escolheram fazer e cujas consequências são as que todos sabemos - não é a deles, que eles jamais fariam tal coisa, mas uma potência metafísica lhe impôs tão terríveis opções. Por enquanto a potência metafísica ainda não é Deus. O culpado da maldade do governo - esse conjunto de seres inimputáveis - é do Tribunal Constitucional que acha que a lei fundamental do país é para ser cumprida. 

Frasquilho deveria ter vergonha do que diz. Eu sei que é tempo perdido, mas recomendo-lhe vivamente a leitura do Críton, de Platão. Quando a Sócrates, após a sua condenação à morte, lhe é proposto uma fuga com êxito assegurado, ele recusa veementemente. Explica que as leis são para cumprir, mesmo que determinem uma sentença injusta, pois sem o cumprimento das leis a vida não é possível. O que se depreende das palavras do deputado Frasquilho é que vivemos num país onde cumprir a lei lesa os interesses do país. Estará ele a apelar a uma Maria da Fonte, a uma patuleia contra o Tribunal Constitucional e a lei? Depois da suspensão da democracia da dr.ª Manuel Ferreira Leite, deveremos suspender a lei? Ao PSD, desde a sua fundação, nunca faltou talento para a acrobacia.

2 comentários:

  1. O Frasquilho é o homem do BES no partido e tem de se mostrar, para que o seu Banco mantenha o lugar de destaque na estrutura partidária. É que a concorrência é muito grande.

    Isto está na mesma, quer dizer pior...
    Abraço

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    1. Mais valia que as bancadas tivessem designações mais consentâneas. Bancos, escritórios de advogados, etc. Assim percebia-se melhor que concepções os deputados representavam.

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