domingo, 27 de outubro de 2013

A idade indecisa

Pablo Picasso - Anciano sentado (1971)

O actual modo de vida está tão carregado de contradições que, quando menos se esperar, o espectáculo da sua ruína não poupará a sensibilidade de ninguém. Não me refiro às velhas contradições que Marx viu no desenvolvimento do capitalismo. Refiro-me a outras mais radicais e que são fruto do desenvolvimento das sociedades modernas. Por exemplo, a questão da idade da reforma. Em Portugal vai aumentar para 66 anos. Percebe-se a intenção do governo. Protelar a hora em que alguém, deixando de trabalhar, vai viver dos sistemas de pensões, para os quais aliás contribuiu. Se o interesse do Estado, enquanto gestor desses sistemas, é obrigar a reformas cada vez mais tardias, o interesse da sociedade civil é o contrário. Por um lado, as empresas não podem ou não querem manter trabalhadores que, devido à idade, terão menos capacidades para se adaptarem a um ritmo ininterrupto de mudanças e inovações. Por outro, as novas gerações necessitam que as mais velhas se reformem para poderem ocupar os seus lugares. O que vai acontecer às pessoas com essa idade indecisa, cada vez um fatia mais substancial da sociedade, para as quais a sociedade civil já não encontra préstimo e o Estado impede de se reformarem? O suicídio tornar-se-á um dever moral?

6 comentários:

  1. Para e eles é a idade da "culpa"...

    Abraço

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    1. Parece que sim, agora as pessoas são culpadas por estarem vivas.

      Abraço

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  2. E se a longevidade de vida também é argumento político para alargar a reforma, o modo como a reforma é aplicada perverte por completo o axioma. O agravamento das condições de trabalho e o empobrecimento são medidas legisladas que anulam benefícios das conquistas da ciência, uma vez que decai a capacidade para sustentar a qualidade de vida até aqui conseguida!

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    1. Ainda por cima, tudo isso é deliberado, planeado e executado com uma frieza e racionalidade assustadoras.

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  3. Ao contrário de outras sociedades que valorizam o saber que advém da idade, aqui os velhos são chutados para canto, em todas as dimensões. Infelizmente o título do filme dos irmãos Coen é uma absoluta - e dramática - verdade.

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    1. A questão da velhice não é nem nova nem um problema apenas das nossas sociedades. Nas nossas está a tomar dimensões muito preocupantes, pois vivemos numa sociedade atomizada, onde os laços foram dissolvidos.

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