sábado, 30 de novembro de 2013

A beatificação de Eanes

Francisco de Zurbarán - La visión del Beato Alonso Rodríguez

Há qualquer coisa de irritante no processo de beatificação em curso do General Ramalho Eanes. Não é que eu antipatize com a personagem. Pelo contrário, acho-a digna e estimável. Julgo mesmo que o General Eanes merece toda a consideração dos portugueses, pois prestou, efectivamente, serviços políticos relevantes ao país. O que me irrita é a sugestão de uma oposição entre o General e os políticos. No fundo, parece mais um candidato à glória dos altares do que um homem político. A beatificação parece que se deve às virtudes éticas que ele ostentou e ostenta. Não duvido que as tenha, mas não é isso que está em questão. A postura moral só tem interesse para um político se o ajudar a conquistar e manter o poder, de resto é, politicamente, irrelevante. Enquanto político, o General Eanes foi um político como os outros e usou a sua figura moral com eficácia para alcançar e manter o poder. Lutou pela afirmação do seu poder pessoal, e esteve longe de ser um homem apartidário. Não teve, por exemplo, nenhum problema moral em patrocinar um partido político a partir de Belém, enquanto era Presidente da República. Um partido lançado contra os partidos que o ajudaram a eleger. O PRD tinha como pano de fundo um projecto de poder pessoal do General Eanes, um projecto que visava liquidar politicamente o PS e Mário Soares. Falhou aí, foi derrotado politicamente. E é esta despartidarização de Eanes, esta quase apolitização da sua figura, que é irritante nas cerimónias de beatificação a que se tem assistido. 

4 comentários:

  1. A beatificação de Eanes e a demonização de Soares...

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    1. De certa maneira, sim. Soares tem um problema. Há muita gente que lhe deve qualquer coisa, fundamentalmente à direita. Agora queriam que ele se portasse bem. Parece que não está pelos ajustes. Felizmente.

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  2. RE não constitui uma referência para mim, seja qual for o ângulo de análise (excepto o não ter aceitado participar no embuste do BPN).
    Aproveitou-se sucessivamente dos "medos" existentes à direita e à esquerda para chegar ao poder. Quando pretendeu chegar lá sozinho falhou rotundamente.
    Se eu fosse pessoa de "altares", nunca pararia em frente do dele.
    Um abraço


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    1. Pessoalmente, julgo que RE moderou um pouco a sociedade portuguesa de então. Não era um político estapafúrdio. A contenção que mostrava era uma coisa boa. Agora, era um político como os outros, e comportou-se como tal. A sua elevação a santo moral parece-me uma idiotice.

      Abraço

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