segunda-feira, 24 de novembro de 2014

O caso Sócrates e o decoro

J. G. Platzer - La venganza de Sansón

Talvez devesse falar da detenção de Sócrates e daquilo que se diz. Não gosto – e é dizer pouco – do personagem e não vou especular sobre um assunto, o dos eventuais crimes, que não é do meu foro. Só espero que, se ele for inocente, a justiça o reconheça e se penitencie do espectáculo que proporcionou. Se for culpado, que o puna segundo a lei. Espero mesmo, em caso de culpa, que a justiça seja mais misericordiosa do que Sócrates (com o aplauso de muitos que agora vitoriam a sua situação) o foi com mais de uma centena de milhares de professores, onde me incluo, a quem ele humilhou, maltratou, prejudicou e usou como bode expiatório de uma situação social e económica fruto dos devaneios, para não dizer outra coisa, dos políticos. Não canto vitória nem abri uma garrafa de champanhe pela sua detenção, como não o fiz aquando da recente condenação de Maria de Lurdes Rodrigues, sua cúmplice política no ataque aos professores. Em cada um de nós deve haver um sentido de decoro para com a infelicidade alheia, mesmo se ela é fruto das sua opções, dos seus delírios e dos seus eventuais crimes, mesmo se aquele a quem a infelicidade tocou nos é repugnante. Não devemos deixar que o mal e a humilhação que sentimos nos corroa a alma. Acredito que todos os homens, na intimidade da sua consciência, sabem distinguir o bem e o mal, mesmo quando mascaram este como se fosse um bem, e todos sabem que sentir felicidade pela desgraça alheia é, eticamente, tão reprovável como provocar a infelicidade dos outros. Foi isto que me foi ensinado e ainda não encontrei razão alguma para alterar a crença nesse ensinamento. A justiça não é o lugar da vingança, nem deve servir de consolação subjectiva aos que clamam vingança.

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