quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

A palavra contribuinte

Ticiano - O dinheiro do tributo (1535-40)

Eu que não sou dado a ódios odeio certas palavras. Mal as oiço fico indisposto. Note-se que essas pobres palavras são originariamente inocentes e, na verdade, não têm culpa nenhuma do uso que delas fazem os homens. Por exemplo, odeio as palavras pedagogia e estratégia, mas isto são contas de um rosário mais antigo. A palavra empreendedorismo faz-me urticária e é sumamente odiosa, tal a invasão de empreendedorismos que houve nos últimos anos. O meu ódio nasce de usarem até à exaustão este tipo de palavras para esconder a realidade, de tal maneira que elas acabam por não significar nada.

Nestes últimos tempos ganhei um ódio especial à palavra contribuinte. Por dois motivos. Em primeiro lugar porque, ao ser usada a torto e a direito, ela perde o seu valor semântico e o contribuinte torna-se um nada sempre disponível para contribuir. Em segundo lugar porque a minha relação com o Estado não é meramente fiscal. Eu, como qualquer um de nós, sou um cidadão e é essa relação que o Estado deve respeitar. O cidadão tem direitos e deveres. O contribuinte têm apenas o dever de pagar. Quando certos partidos se dizem partidos de contribuintes, eu fico logo mal disposto. Quando dizem que defendem os contribuintes, dá-me vontade de rir. Dispenso que me defendam enquanto contribuinte. Prefiro ser respeitado enquanto pessoa e cidadão. Se o fizerem, em vez de encherem a boca com a palavra contribuinte, limitarão ao indispensável o confisco dos bens.

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