quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

António Costa

Pierre Bonnard - La Chasse (1908)

A minha crónica quinzenal no Jornal Torrejano.

Agora que os ânimos mais exaltados descobriram o ridículo em que navegavam, vale a pena tentar perceber o significado político das opções de António Costa, da troca da velha aliança com a direita por uma aliança à esquerda. A leitura mais simplista é dizer que o fez para não sair da vida política. Isto não é falso, mas é não entender tudo o que estava em jogo. Para além do futuro político de António Costa, o do Partido Socialista. Se o PS fizesse aquilo que a direita ou Francisco Assis pretendiam – apoiar um governo de PSD/CDS – o futuro do PS seria muito negro. Tornar-se-ia, a curto prazo, irrelevante no panorama político português.

António Costa revelou-se não apenas hábil na manobra política mas ainda um profundo conhecedor da realidade portuguesa, tanto da realidade das elites políticas como do espírito popular. Calculou que a sua esquerda não tinha outro remédio senão apoiar um governo seu, mesmo que não esteja especialmente entusiasmada com a experiência, como é o caso do PCP. Calculou que a direita e o Presidente da República, para além da indignação e da exaltação, só tinham de aceitar a nova configuração parlamentar e dar posse a um governo PS. Não temeu sequer que a direita conseguisse organizar uma fronda contra a sua solução. Na verdade, a fronda foi tentada, mas a sociedade não se comoveu por ver PSD e CDS postos fora da governação. Não estamos em tempo de Marias da Fonte.

Será esta opção eficaz para salvar o PS da irrelevância? No mínimo dá-lhe tempo. A situação política na Europa, da qual depende a nossa, é muito instável e imprevisível. Se a Europa persistir na imposição de uma austeridade extrema, o mais natural é António Costa deixar de ter espaço de manobra para manter o acordo com os partidos à sua esquerda. Estes, contudo, ficam com o ónus de o derrubarem, de abrirem o caminho para uma nova vitória da direita e, o que é uma real possibilidade, de verem uma parte do seu eleitorado votar PS.

Se a Europa tiver aprendido alguma coisa e se António Costa tiver o mesmo grau de habilidade política e de conhecimento dos actores europeus que teve no caso português, então é possível que o governo se mantenha até ao fim da legislatura. O que ganha o PS com isso? Evitar o seu desaparecimento como grande partido e, ao mesmo tempo, reforçar a possibilidade de acordos à esquerda, trazendo o BE e a CDU para a esfera da governação e da responsabilidade pelos destinos do país. Ao mesmo tempo o PS recentra a vida política. Por outro lado, os socialistas serão julgados por aquilo que o governo de António Costa fizer e não pela governação de José Sócrates. Não será pouco.

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