sábado, 14 de julho de 2018

Sem enredo


Alguém se queixa não sem indignação, numa caixa de comentários de um grande armazém de livros, de que os contos de uma certa autora não têm nada que se pareça com um enredo. Com um plot, pois a queixa vem em língua inglesa. Percebo o drama dos que contestam a literatura sem enredo. Usam a leitura como uma fuga ao mundo, uma consolação que os protege do facto inaceitável de a sua vida não possuir qualquer enredo. Coisas acontecem, umas repetem-se e outras não, mas, na verdade, nas nossas tristes vidas o arbitrário, o ocasional e o acidental são a regra e não a excepção, mesmo que teimemos no contrário, mesmo que pareça o contrário. "O vento sopra onde quer; ouves-lhe o ruído, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai." Também o evangelista João sabia que a vida não tem enredo. E se estamos todos in media res isso significa apenas que estamos no meio de um turbilhão sem sentido nem trama, esbracejando até morrer de cansaço.

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