Olhando para o resultado
eleitoral de 18 de Maio, importa perceber o que se está, subterraneamente, a
mover para gerar os resultados a que se chegou. Parte-se de duas premissas. Em
primeiro lugar, este mover-se da configuração eleitoral vem de trás — não
apenas de há um ano. Em segundo lugar, não se trata de um movimento nacional,
mas atinge parte substancial do denominado mundo ocidental. Há excepções,
claro, mas são muito específicas. A análise centra-se em três domínios: social,
cultural e político.
Do ponto de vista social, a
derrota da esquerda — em especial a do Partido Comunista, uma derrota que
acentua as muitas que vem sofrendo há longos anos — torna evidente que os
conflitos sociais e as lutas de classe deixaram de poder ser enquadrados na velha
oposição entre proletariado e burguesia e na retórica da revolução. Hoje, as
classes populares não querem revoluções nem se sentem parte de uma classe.
Revoltam-se porque a vida não lhes permite expandir a afirmação da sua
individualidade através do consumo e das práticas de reconhecimento social. A
sua revolta não é contra os patrões, mas contra as elites intelectuais e
políticas, que funcionam como bode expiatório.
O resultado obtido pelo Bloco de
Esquerda (BE) simboliza um eleitorado que não está interessado nas causas
fracturantes que foram a agenda do BE e de parte do Partido Socialista. As
questões de género, de identidades sexuais, de interpretação da história — tudo
isso sofreu uma derrota substancial. O confronto cultural que a esquerda, a
partir de certa altura, decidiu erguer como bandeira contra a direita salda-se,
nesta hora, numa pesada derrota. A esquerda substituiu o antigo conflito contra
a religião por um conflito cultural. Ora, este não é mais do que velho conflito
religioso, agora secularizado.
Por fim, a questão política. Em
primeiro lugar, a implosão, acontecida já noutros países, da tradicional
dicotomia direita–esquerda. A esquerda tornou-se irrelevante para as coisas
essenciais, como a revisão constitucional. Isto não significa que a velha
dicotomia esteja morta — está muito doente. Contudo, o dado essencial é outro.
Do ponto de vista político, estas eleições representam uma dura derrota para as
visões cosmopolitas, para a ideia de cidadania mundial. O eleitorado português,
como o de muitos outros países, está a reivindicar o retorno ao velho
Estado-Nação e às regras de inclusão e exclusão que eram as dele. Esta é a nota
política mais importante.
Em síntese: afirmação de um novo
eixo da luta de classes, derrota da esquerda na guerra cultural e afirmação do
poder de atracção do velho Estado-Nação e do nacionalismo que lhe subjaz.
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