Em 1923, Joseph Roth, referindo-se ao protagonista do seu
primeiro romance, escreveu: “Era o jovem europeu: nacionalista e egoísta, sem
fé, sem lealdade, sedento de sangue e limitado. Era a jovem Europa.” Este jovem
europeu era protofascista e, com o andar dos anos, tornou-se fascista. O
resultado é conhecido: o fascismo italiano, o nazismo alemão, diversas cópias,
mais ou menos fiéis, em países europeus, e, acima de tudo, a segunda guerra
mundial e o genocídio judaico. Os jovens europeus, no pós-guerra, foram-se
tornando outras coisas. Derivaram para a esquerda, tornaram-se antifascistas. Um
pouco mais tarde, foram campeões do liberalismo: primeiro, de costumes; depois,
de mercado. A certa altura do percurso, a juventude europeia, como outras,
mergulhou na internet e nas redes sociais, uma vida sedentária, sombria, vivida
no quarto.
Agora, começa a descobrir-se que os jovens europeus estão
cansados da vida sedentária. Enquanto a velha Europa definha numa crise
demográfica de grandes proporções, aquela jovem Europa – na designação irónica
do escritor austríaco – está de volta, com os mesmos jovens limitados,
nacionalistas, egoístas, sem fé nem lealdade, e, começa a perceber-se, sedentos
de sangue. Uma crise de masculinidade terá atingido parte dos rapazes e,
desconfiados da sua natureza, parecem ter uma necessidade de exibir, como uma condecoração,
a mais rasteira misoginia e um culto da violência, que começa a passar das
redes sociais para as ruas. A discussão sobre se as actuais extrema-direita e
direita populista são ou não fascistas é irrelevante. O importante é a pulsão
que conduz muitos jovens – principalmente, do sexo masculino. E esta pulsão é
violenta, nacionalista e, em potência, violenta.
A situação social e política em que vivemos é, do ponto de vista económico, social e político, muito diferente da que se vivia na Europa do fim da primeira guerra mundial. Contudo, há um ponto em comum: a proliferação do ressentimento. Foi o ressentimento de largas camadas da população que deu combustível ao fascismo e ao nazismo. Ora, apesar de as pessoas, mesmo as mais pobres, viverem muito melhor do que nessa altura, o ressentimento multiplica-se. Seja devido à presença de estrangeiros ou à comparação com as elites, a massa dos ressentidos, na qual a presença de jovens rapazes é significativa, cresce e está a tornar-se um problema para as democracias liberais. Nos anos vinte e trinta do século passado, os políticos democráticos foram impotentes para lidar com essa “jovem Europa”. Resta saber se, passado um século, aprenderam alguma coisa.
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