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Photographer unknown, Massacre in Christian area, Chania - Crete, 1897 |
Kyrie Eleison
sexta-feira, 24 de junho de 2022
O progresso moral da humanidade (7)
quarta-feira, 22 de junho de 2022
A Garrafa Vazia 92
segunda-feira, 20 de junho de 2022
Beatitudes (54) A inocência
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W. Eugene Smith, Baby chimpanzee holding kitten, 1954 |
sábado, 18 de junho de 2022
Escavar no romance português
Está calor. Em vez de falar de política, como habitualmente, o melhor é derivar e falar de literatura. Não é que o assunto interesse mais aos portugueses do que a política. Não interessa, mas ajuda a suportar o calor e a inflação. Um salto ao século XIX pode ser uma viagem interessante. O romance moderno português terá começado nesse tempo. O problema é que sabemos muito pouco do que aconteceu aí, do fervilhar romanesco, da quantidade de gente que procurou a glória não na guerra, mas na literatura. Há para isso, como para tudo, culpados. Façamos o elenco destes. Almeida Garrett, Alexandre Herculano e, principalmente, Camilo Castro Branco, Júlio Dinis e Eça de Queirós. Garrett e Herculano, do ponto de vista romanesco, não são muito fecundos, o mesmo não se pode dizer de Camilo e Eça. Júlio Dinis ocupa um lugar intermédio. Quem mais fez romances no XIX?
Alguém dirá Rebelo da Silva, Arnaldo Gama ou, mesmo, Teixeira de Vasconcelos. Não será mau, mas a realidade é muito mais ampla e mais rica. Quem foi o autor de quem Óscar Lopes e António José Saraiva, verdadeiras autoridades no assunto, disseram ser “o melhor realizador, em Portugal, do romance tal como o concebeu Balzac”? O senhor dava pelo nome de Francisco Teixeira de Queirós. Quem ouviu falar dele? Nos últimos tempos tenho-me dedicado a espiolhar esse século romanesco. Foi aí que o descobri. Descobri mais, uns mais exaltantes do que outros, mas tudo gente que teceu o lençol com que o romance português se cobriu até aos dias de hoje. Eis alguns nomes descobertos: Alberto Pimentel, António Pedro Lopes Mendonça, Faustino da Fonseca, Francisco Gomes de Amorim, Gervásio Lobato (o do romance Lisboa em Camisa), Guilherme Centazzi (o autor do primeiro romance português), Joaquim Leitão, Manuel Pereira Lobato, Manuel Pinheiro Chagas, etc., etc.
Estes escritores não terão o dom literário de um Camilo ou de um Eça, mas fazem parte de um movimento que lançou as bases do romance em Portugal, o qual teve um momento superlativo, no que toca ao reconhecimento, com a atribuição do Prémio Nobel a José Saramago. É esta história que não deveria ser esquecida. E o esquecimento não atinge apenas o século XIX. Ele expande-se para o século XX. Também aqui os grandes nomes lançam um véu sobre os outros, os quais também ajudaram a tornar o português uma língua literária importante. O pior é que nem a iniciativa privada nem a iniciativa pública parecem estar interessadas em fazer ressurgir esses autores que contribuíram para sermos aquilo que hoje somos. Falta de mercado, dirão. Falta de iniciativa, parece-me.
quinta-feira, 16 de junho de 2022
Nocturnos 82
terça-feira, 14 de junho de 2022
A Garrafa Vazia 91
domingo, 12 de junho de 2022
A persistência da memória (15)
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Nicola Perscheid, Der Schnitter,1901 |
sexta-feira, 10 de junho de 2022
Nocturnos 81
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Edward Hopper, Nighthawks, 1942 |
quarta-feira, 8 de junho de 2022
Simulacros e simulações (35)
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Raoul Hausmann, Objectif-loupe,1931 |
segunda-feira, 6 de junho de 2022
A Garrafa Vazia 90
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Sol LeWitt, A dark square on a light square and vice versa, 1982 |
desliza
pela fenda aberta
no coração corroído
pelo vento.
Chega, monstro
purulento,
do espaço sideral,
presa na corda
entrançada da noite.
Os lábios abrem-se
para o gargalo,
e a morte aninha-se
na garrafa
sombria da vida.
sábado, 4 de junho de 2022
A fraternidade
Isso mesmo é reconhecido pelo Manual da Doutrina Social da Igreja Católica. No capítulo referente ao fundamento e ao fim da comunidade política, no ponto 390, reconhece-se que o princípio da fraternidade “permaneceu em grande parte não realizado nas sociedades políticas modernas e contemporâneas, sobretudo por causa da influência exercida pelas ideologias individualistas e colectivistas”. A Igreja entende a fraternidade como amizade civil, e esta surge como o revelador do “significado profundo da convivência civil e política”. A formulação é bastante inteligente ao traduzir fraternidade não por uma leitura étnica, os cidadãos unidos por laços de sangue, mas por amizade civil. Uma amizade entre cidadãos. Não só evita derivas racistas, como sublinha a importância da ideia de comunidade gerada na amizade cívica, na qual terão lugar os direitos e os deveres ligados à liberdade e à igualdade.
A fraternidade significa um exercício de solicitude para com todos os nossos concidadãos. Assim como devemos cuidar dos nossos amigos, também devemos cuidar dos nossos concidadãos. Este cuidar dos outros não é uma mera exigência moral, mas um imperativo político. Através dessa amizade cívica compreende-se que devo cuidar tanto do meu interesse, como do interesse de qualquer outro. Esta interconexão de interesses pelos quais todos somos mutuamente responsáveis forma o bem comum e a própria comunidade política. A fraternidade é, então, esse princípio que nos ordena cuidar da comunidade política, como o lugar onde o bem comum se desenvolve e protege, através da amizade cívica. É da solicitude cívica que o próprio poder extrai a sua legitimidade. O facto de a fraternidade não merecer particular atenção mostra quão frágeis podem ser os regimes políticos modernos e os perigos que correm. A fraternidade é o mais fundamental dos princípios da Revolução Francesa.
quinta-feira, 2 de junho de 2022
Reindustrializar?
Os países ocidentais, com os EUA à cabeça, iniciaram um processo de libertação da dependência industrial da China e de outros fornecedores asiáticos. As indústrias ocidentais, em busca de mão-de-obra barata, deslocalizaram-se para o Oriente, enquanto se assistia nos EUA e na Europa a uma desindustrialização mais ou menos profunda. O processo é interessante porque pode ser lido a partir da dialéctica do senhor e do escravo, uma parábola teórica do filósofo alemão do século XIX Georg W. F. Hegel. A busca de mão-de-obra tendencialmente escrava acabou, como ensina Hegel, por tornar dependentes os senhores dos seus próprios escravos, estando a inverter-se os papéis.
O Ocidente descobriu-se com um problema em casa. Esse problema traduz-se não só na dependência de terceiros, como na destruição da estrutura social que tinha permitido criar sociedades equilibradas e com um módico de justiça social. Em vez disso, temos agora um enorme fosse entre os mais ricos e os outros, temos classes médias à deriva e, do ponto de vista político, emergiram populismos de diversa orientação que ameaçam a democracia liberal e o Estado de direito. O Ocidente está a descobrir que o excesso de liberalismo mata as sociedades liberais e encaminha-as para o autoritarismo.
O irónico de tudo isto – ou o trágico – é que o sonho da reindustrialização do Ocidente chega num momento em que se deveria estar a discutir a transição para sociedades pós-industriais em todo o mundo. O motivo é simples. A Terra parece não estar pelos ajustes com a forma como os humanos se relacionam com ela. A degradação ambiental e as alterações climáticas são de tal ordem que, a cada dia que passa, surgem novas evidências de que a espécie humana se está a precipitar para um abismo de onde não há retorno. Isto implica pensar noutro tipo de economia. Não me refiro à substituição da empresa privada e do mercado, mas de uma economia de consumo frugal, de trabalho reduzido e de rendimento diminuído.
O que se deveria estar a discutir no mundo não é como aumentar o rendimento e o consumo, mas como empobrecer e como assegurar uma partilha justa desse empobrecimento. Isto não significa um retorno ao passado, mas uma procura de novas formas de vida cujo sentido não seja dado pela posse e pelo consumo. Esse empobrecimento significa, antes do mais, um emagrecimento. Sofremos todos de obesidade mórbida. Não se trata de excesso de quilos, mas de excesso de roupas, de carros, de gadgets, de viagens, de comidas, de férias, de experiências, etc., etc. Pensar que reindustrializar o Ocidente o salva é pensar que vale mais morrer de ataque cardíaco do que de COVID.
terça-feira, 31 de maio de 2022
A persistência da memória (14)
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Gertrude Käsebier, Blossom Day, 1904-05 |