A minha crónica no Jornal Torrejano.
A situação política está mais confusa do que parece. Só há
um dado claro e inequívoco. Exceptuando os socialistas, todos os actores agem
com o objectivo de evitar que o PS obtenha maioria absoluta nas próximas
legislativas. CDS e PSD pretendem recuperar terreno e penetrar no centro
político. BE e PCP sabem que uma maioria absoluta dos socialistas será obtida à
custa dos votos da esquerda. Ainda menos interessado numa maioria de António
Costa está Marcelo Rebelo de Sousa. Isso libertaria o governo da actual submissão
ao Presidente da República e tiraria a este qualquer possibilidade de
influenciar decisivamente a governação do país, como tem feito desde os
incêndios do ano passado.
Numa sondagem da Aximage, as intenções de voto no PS caem
pelo quarto mês consecutivo. Este declínio – aliado aos conflitos laborais, ao
preço dos combustíveis e à memória da tragédia dos incêndios – torna imprevisíveis
as negociações do próximo orçamento de Estado. Até há pouco toda a gente estava
convicta de que se o BE e o PCP derrubassem o governo socialista teriam pesadas
perdas eleitorais. Esta percepção, porém, pode estar a mudar. Neste momento,
não é claro que, em eleições antecipadas, os socialistas consigam ir buscar
votos à sua esquerda. Devido, principalmente, à acção do Partido Comunista,
instala-se a convicção, em parte do eleitorado de esquerda, de que um voto no
PS é um voto inútil, caso esse PS não esteja dependente dos partidos à sua
esquerda.
Os socialistas pensaram que iriam capitalizar o sucesso
político da solução governativa e ficaram presos nesse sucesso. A retórica da
saída da austeridade abriu a porta para que no Estado as reivindicações dos
vários corpos existentes se tornassem cada vez mais impiedosas. A narrativa do
fim da austeridade desfaz-se perante essas exigências e, também, o cansaço da
sociedade civil com a carga fiscal. Por outro lado, uma certa arrogância típica
dos socialistas está a escavar-lhe as bases de apoio. António Costa, que
parecia ter uma vida fácil, tem, a cada dia que passa, a vida mais complicada.
Nem os seus adversários políticos, nem os aliados actuais, nem o Presidente da
República, nem a população parecem dispostos a estender-lhe um dedo. Pelo contrário.
Desde há uns tempos que olho para António Costa e me lembro de Agamémnon, o rei
grego que encontrou a morte – isto é, a derrota – no regresso vitorioso de
Tróia. Dias difíceis para o PS.