A recente ronda
de debates pré-eleitorais teve o condão de mostrar ao que a política, em
sociedades como a nossa, se transformou. Não me refiro aos debates propriamente
ditos, ao desempenho dos protagonistas, mas à futebolização da política que
eles consumaram. A comunicação social achou por bem transformar o acontecimento
numa espécie de campeonato. Acabo de receber, vinda de um jornal de referência,
a tabela com a classificação final. O campeão foi João Cotrim Figueiredo, que
por certo irá participar no ano que vem na Liga dos Campeões. São despromovidos
à segunda-divisão Francisco Rodrigues dos Santos e André Ventura.
Um dos
problemas desta abordagem do confronto político é que o resultado depende
totalmente dos árbitros. No futebol, por muito que um árbitro possa distorcer o
resultado através de más decisões, há ainda os golos que são marcados e os que
são falhados. O que os jogadores fazem em campo tem, por norma, relevo para o
resultado. No caso dos debates, o que conta são as paixões políticas dos
árbitros-comentadores. Os resultados dizem mais daqueles que atribuíram
classificação que do desempenho dos políticos. Este problema, apesar de tudo,
tem pouco relevo.
Um problema mais
grave é a transformação completa da política num confronto entre hooligans
de várias cores. A hooliganização da política é interessante para
a comunicação social, pois gera continuamente tempo de antena. Os políticos
preocupam-se em marcar pontos – isto é, golos – através daquilo que um hooligan
pode perceber, ideias simples e soluções simplistas. Os grandes problemas,
devido à sua complexidade, são arredados da campanha eleitoral, tornam-se
secretos. A ânsia da comunicação social em dominar a política conduz a que esta
se torne cada vez mais obscura, pois o recurso a uma linguagem básica e ao
fogo-de-artifício oculta as dificuldades que estão por detrás das várias
soluções propostas.
Não menos grave
é que esta futebolização da política instaura um caldo cultural propício para
projectos populistas. O populismo é uma forma de hooliganismo político.
Vive de ideias simples e de afirmações bombásticas. Actua no campo das emoções
e dos sentimentos e progride pela eliminação do debate sensato e do exame
racional dos problemas. A comunicação social, que em tempos teve um importante
papel na vida democrática, está a criar condições culturais e psicossociais
favoráveis a projectos autoritários. A lógica de mercado a que essa comunicação
social está sujeita impede-a de reconsiderar a sua actuação. Ela vive não da
informação, mas do desencadear das emoções, tal como o futebol.