Albert Gleizes - Contemplação (1944)
Os filósofos
têm apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questão,
porém, é transformá-lo. (Karl Marx, Teses sobre Feuerbach)
A velha tese marxiana parece, mais do que nunca, fazer todo o sentido. O que pode interessar, para a difícil situação em que se vive, as vãs interpretações dos filósofos? Não será mais curial lutar pela transformação do mundo? A tese, que sempre me fascinou, não deixa de ser enigmática. Fará sentido esta relação adversativa entre interpretação e transformação? Se eu não interpreto, como posso saber que o mundo deve ser transformado? Sim, eu sei, Marx acusa os filósofos de ficarem pela mera interpretação e de não realizarem, de não tornarem real, a filosofia. Mas para mim o mais enigmático de tudo é o peso da transformação. Só a acção dos homens transforma o mundo.
Ora o triunfo da acção sobre a interpretação é obra do mundo capitalista e burguês. Marx ficou fascinado pela lógica operativa burguesa e, no fundo, é essa lógica que ainda ressoa neste hino marxiano à transformação do mundo. A nossa experiência é diferente. Estamos aturdidos por tanta transformação. Não terá chegado o tempo de revalorizar a interpretação? Mais do que de revolucionários transformadores, o mundo precisa de gente que produza teoria (a velha θεωρία dos gregos). Contemplar para interpretar. Contemplar para compreender. Contemplar para encontrar a acção justa e ajustada. Não, o mundo está cheio de revolucionários de todas as cores. Precisa, porém e com urgência, de contemplativos.