Imagem obtida através de IA DALL.E 2 da OpenAI |
sábado, 29 de abril de 2023
Simulacros e simulações (48)
quinta-feira, 27 de abril de 2023
A persistência da memória (22)
Heinrich Kühn, Wäscherin in der Düne, 1903 |
terça-feira, 25 de abril de 2023
Cardílio (24 sonetos) 12
Imagem obtida através de IA DALL.E 2 da OpenAI |
Que nome ao rio lhe davas, esse
rio
Que vejo pobre e solto entre margens?
Quando o Sol inclemente te cansava,
As suas águas de luz te acolhiam.
Suspenso pelas margens frias do Outono,
De amargo fel rasgadas, tão parado
Na lânguida quietude dessa tarde,
Entregavas da língua o prostrado
Murmúrio, velho canto para sempre
Na treva soterrado. Navegante
Não és, nem do rio tens saber sagrado.
Os deuses, os teus deuses embarcaram,
Rumaram para longe, para um céu
De vidro transparente na verde água.
2007
domingo, 23 de abril de 2023
Comentários (6)
Vincent van Gogh, Farmhouse in Nuenen, 1885 |
sexta-feira, 21 de abril de 2023
A guerra entre sexos
Uma notícia curiosa, mas, em aparência, sem relevo. No Público (online) de 11 de Abril, um texto apresentava o seguinte título: Na Croácia, homens ajoelham-se para rezar pela “restauração da autoridade masculina”. No lead da notícia, acrescentava-se: No primeiro sábado de cada mês, um grupo de homens católicos ajoelham-se (em locais públicos) para pedirem o fim do aborto, do sexo antes do casamento ou das roupas “provocantes”. O que se deve perguntar perante este fenómeno é se ele não passa de uma bizarria ou se, sendo bizarro, traz consigo um aspecto revelador do que se está a passar no mundo ocidental. No último artigo, reflectiu-se sobre como o nacional-populismo se apoderou do futuro. Este artigo foca-se num aspecto que irá ter crescente importância no discurso dos nacionais-populistas, a questão da relação entre homens e mulheres.
A gradual igualdade entre homens e mulheres – nomeadamente, na gestão da sua própria sexualidade – parece estar a atormentar cada vez mais um número significativo de homens. Não apenas a questão da sexualidade, embora esta seja central, mas também o facto de as mulheres terem desempenhos muito mais competentes e focados em muitas áreas, começando pelos estudos e acabando no mundo profissional, onde não são dominantes porque a rede masculina consegue estancar a sua ascensão em massa aos lugares de topo. A liberdade sexual das mulheres trazida pela pílula e pela revolução dos costumes nascida com o Maio de 68, aliada ao poder de focagem que elas têm demonstrado ao nível da educação e da profissionalidade, está a deixar muitos homens inseguros e incapazes de suportar a situação.
Isto é muito claro em países como os EUA ou o Brasil, onde o apoio a Trump e a Bolsonaro se liga a modelos de masculinidade impositiva, que trazem uma promessa de restauração dos velhos tempos da dominação do homem sobre a mulher. Na Europa, esses movimentos são menos visíveis, mas será uma questão de tempo, como prenunciam já as manifestações dos grupos de homens croatas ou aquilo que se passa na Hungria ou na Polónia. Seria, por outro lado, um erro pensar que este tipo de aspiração só teria eco entre homens com masculinidade tóxica. Encontra, e vai encontrar cada vez mais, apoio entre grupos de mulheres, como se vê no Brasil ou nos EUA. Esta questão irá contaminar a política e abrir uma frente de combate muito polarizada, com os nacionais-populistas a alimentar a fogueira. Ainda não se percebe muito bem, mas a questão central da política, o lugar dos grandes conflitos, será cada vez mais o problema da igualdade entre homens e mulheres. Passamos da velha luta de classes à guerra entre sexos.
quarta-feira, 19 de abril de 2023
Nocturnos 101
Fernando Calhau, sem título, 1978 |
segunda-feira, 17 de abril de 2023
Ensaio sobre a luz (100)
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sábado, 15 de abril de 2023
Cardílio (24 sonetos) 11
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Cânticos invernais soam na luz
De lápides, tijolos ou na dor
Das aves esmagadas pelo mármore
Das horas, pelo ferro do oblívio.
Os deuses estão mortos, as estátuas
De sal jazem erguidas sobre a terra.
Cruéis, torpes, exaustas pelos anos
Que sobre elas velozes se passaram
No ardor dos dias, na rápida e trémula
Cinza, há vencidos pássaros, que cantam,
Que cantam o teu nome enegrecido.
São pássaros finais, grasnam na noite
Sem Lua, na ventania sobre os telhados.
Gritam a triste glória dos vencidos.
2007
quinta-feira, 13 de abril de 2023
Beatitudes (59) No lago
Paul Pichier, San Vigilio (Gardasee), 1908 |
terça-feira, 11 de abril de 2023
Simulacros e simulações (47)
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domingo, 9 de abril de 2023
Nocturnos 100
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sexta-feira, 7 de abril de 2023
O nacional-populismo e o futuro
São estas questões que, segundo os autores, alimentam os nacionais-populistas. Acrescentaria, um quinto D, que os autores não referem, embora tenham em conta algumas das suas vertentes. Desestruturação da rede de valores tradicionais que orientaram as comunidades, a perda de relevância da religião, a revolução nos costumes, nomeadamente na sexualidade, a supremacia do estético sobre a moral e o hedonismo. Estes quatro (ou cinco) fenómenos, contudo, são apenas sintomas de uma questão mais decisiva e que se prende com a natureza da política. O que está em jogo na política é a imortalidade do homem, compreendida como a persistência no tempo das comunidades humanas. A arte política visa assegurar que a comunidade tem um futuro. O nacional-populismo cresce porque existe em parte dos eleitores um sentimento de que a sua comunidade corre perigo de morte.
Todos os D
diagnosticam doenças que, combinadas, se tornarão mortais. A esta percepção (seja
real ou imaginária) não é estranha a pulsão liberal para substituir a política,
com a sua tensão entre amigos e inimigos, pela mera gestão das coisas. O
nacional-populismo é uma reacção à morte da política e manifesta-se como exploração
do sentimento de um fim próximo da comunidade política a que se pertence. As
forças democráticas erram se pensam que iludir as questões colocadas pelos
diversos D é um caminho para evitar o crescimento do populismo. Não é,
pois este enraizou-se numa questão decisiva da existência humana, a do futuro
da comunidade. O populismo colonizou o horizonte de expectativa. Resta saber
como os valores da democracia liberal e do estado de direito podem resistir
perante um inimigo que se se está a apoderar, com êxito crescente, apesar de
algumas derrotas significativas, do futuro.
quarta-feira, 5 de abril de 2023
Cardílio (24 sonetos) 10
Imagem obtida através de IA da CANVA |
Sons e silêncios, pedras,
ervas, águas,
Verdes prados cerzidos na memória.
Nas folhas da figueira, corre a seiva,
O sopro puro e quente da tua boca.
P’la rua, se caminhavas, desprendia-se
Da luz um raio de âmbar, e dos gestos,
Que de ti se afastavam, irrompia,
Na distância, a luz da Primavera.
Nas sílabas abertas em teu rosto,
Vincado pelos dias de branca névoa,
Ouve-se ainda altivo e luminoso
O sonoro descanso de tua voz,
Mar de melancolia, terra de fogo:
Lácio, língua, silêncio, branca ardósia.
2007
segunda-feira, 3 de abril de 2023
Comentários (5)
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sábado, 1 de abril de 2023
A educação e o ChatGPT
Em 1977, Ernst Jünger publicou o romance Eumeswil. Um dos elementos futuristas presentes na obra é um dispositivo denominado luminar. Este permitia fazer perguntas sobre História e devolvia, num monitor, respostas textuais adequadas ou, mesmo, representações vivas dos acontecimentos. Menos 50 anos depois, a realidade aproxima-se do futurismo de Jünger. O ChatGPT da OpenAI ainda não devolve cenas históricas vivas, mas responde a perguntas e não apenas de História, mas de todas as áreas. É uma tecnologia baseada na inteligência artificial. Fornece informação adequada, embora também forneça respostas com erros. No entanto, eliminar os erros e tornar as respostas precisas é uma questão de tempo.
Durante a minha vida, vi chegarem muitas novidades ao sistema de ensino, mas nenhuma alterou radicalmente a natureza deste. As tecnologias de comunicação democratizaram o acesso à informação, isso, porém, não representou uma ruptura, pois a informação sempre esteve no centro do ensino. Permitiram formas mais atraentes de comunicação, mas o essencial continuava como sempre tinha sido. Uma tecnologia como o ChatGPT implica uma mudança de natureza da prática formativa dos alunos e da função dos professores. Estes deixarão de ser mediadores de informação para ser outra coisa.
O professor, em primeiro lugar, deve ajudar os alunos a compreender os problemas a trabalhar e ensiná-los a fazer questões pertinentes à inteligência artificial. Não ensina respostas dadas, mas a fazer inquéritos articulados para obter informação trabalhada. Uma segunda função docente é a de ensinar os alunos a estabelecerem protocolos e estratégias de monitorização da qualidade da informação obtida. Por fim, os professores devem ser criadores de modelos de apresentação, pensados em função de desenvolvimentos cognitivos pretendidos, dos resultados obtidos pelos alunos nos seus inquéritos. Pela primeira vez, a tecnologia presente no ChatGPT torna realmente obsoleta a existência de avaliações das aprendizagens baseadas em provas como testes.
Os professores têm resistido e com razão à transformação das suas funções. A tecnologia disponível não lhes permitia abandonar com segurança a tradicional função de mediadores de informação. O ChatGPT veio mudar a realidade, resta saber quanto tempo vão demorar os sistemas de ensino a adaptar-se a um novo mundo. Recordo que Platão, no final do Fedro, escreveu uma terrível diatribe contra os malefícios da escrita. O resultado foi o que se viu, nulo. Não vale a pena, agora, diabolizar a inteligência artificial, o resultado será idêntico à diabolização da escrita por Platão.