sexta-feira, 7 de abril de 2023

O nacional-populismo e o futuro


Em Populismo - A revolta contra a democracia liberal (2018), Goodwin & Eatwell argumentam que os votos nos nacionais-populistas não são de protesto contra o sistema, mas uma adesão comprometida com a visão política desses partidos. No cerne dessa adesão estariam “quatro D”. Desconfiança dos cidadãos, devido ao elitismo da democracia liberal, nas instituições e políticos democráticos. Destruição das comunidades e da identidade nacional causada pela imigração e a mudança étnica. Despojamento sentido pelas pessoas em consequência da globalização, o aumento das desigualdades e a perda de esperança. Desalinhamento entre o povo e os partidos tradicionais, com a quebra dos laços que ligavam eleitores e partidos.

São estas questões que, segundo os autores, alimentam os nacionais-populistas. Acrescentaria, um quinto D, que os autores não referem, embora tenham em conta algumas das suas vertentes. Desestruturação da rede de valores tradicionais que orientaram as comunidades, a perda de relevância da religião, a revolução nos costumes, nomeadamente na sexualidade, a supremacia do estético sobre a moral e o hedonismo. Estes quatro (ou cinco) fenómenos, contudo, são apenas sintomas de uma questão mais decisiva e que se prende com a natureza da política. O que está em jogo na política é a imortalidade do homem, compreendida como a persistência no tempo das comunidades humanas. A arte política visa assegurar que a comunidade tem um futuro. O nacional-populismo cresce porque existe em parte dos eleitores um sentimento de que a sua comunidade corre perigo de morte.

Todos os D diagnosticam doenças que, combinadas, se tornarão mortais. A esta percepção (seja real ou imaginária) não é estranha a pulsão liberal para substituir a política, com a sua tensão entre amigos e inimigos, pela mera gestão das coisas. O nacional-populismo é uma reacção à morte da política e manifesta-se como exploração do sentimento de um fim próximo da comunidade política a que se pertence. As forças democráticas erram se pensam que iludir as questões colocadas pelos diversos D é um caminho para evitar o crescimento do populismo. Não é, pois este enraizou-se numa questão decisiva da existência humana, a do futuro da comunidade. O populismo colonizou o horizonte de expectativa. Resta saber como os valores da democracia liberal e do estado de direito podem resistir perante um inimigo que se se está a apoderar, com êxito crescente, apesar de algumas derrotas significativas, do futuro.

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