terça-feira, 6 de setembro de 2016

O casticismo da direita portuguesa

Pablo Picasso - Corrida de toros (1934)

A direita portuguesa, por mais que tente, não consegue disfarçar. Nela, o casticismo é sempre uma espécie de gato escondido com o rabo de fora. Veja-se o retorno da tourada do CDS, agora pela mão da Juventude Popular. Apesar de envergonhada (uma vergonha que nasce do incómodo político), a direcção do partido apoia. Ressalvo desde já que não sou anti-touradas. Nasci no Ribatejo, e a cultura tauromáquica não me é radicalmente estranha. Não sou aficionado, não frequento praças de touros, mas não milito a favor da proibição desse tipo de espectáculo. Reconheço, porém, que ele representa um mundo que, felizmente, morreu. O que me interessa, todavia, é a questão política.

O que significa este retorno da tourada, em nome da tradição, pela mão de um partido da direita parlamentar portuguesa? Representa uma contradição insanável entre o que se esperaria de uma direita liberal e modernizadora – o que a retórica do CDS gosta de arvorar – e o respeito por tradições que defendem o privilégio de casta em vez da concorrência e do triunfo do mérito. A tradição castiça na política portuguesa remonta ao absolutismo de D. Miguel. E até hoje a direita não conseguiu abandonar os seus tiques castiços. A inexistência de correntes liberais em Portugal deve-se ao peso enorme que o casticismo, mais explícito ou mais envergonhado, tem na direita portuguesa.

Por muitos blogues ditos liberais e jornais tipo Observador que haja, por muito que certas vozes mais liberalizantes surjam no espaço público, o rabo de fora do casticismo nunca desaparece. Infelizmente para Portugal, a nossa direita é, de uma forma esmagadora, castiça. O que está em jogo em muito das suas políticas não é um projecto liberal de modernização, mesmo quando usa retoricamente este tipo de palavreado. O que está em jogo é a defesa de uma tradição que pretende proteger os que pertencem à boa casta, evitar que o livre jogo da vida - e do mercado - lhes retire os privilégios. A tourada da Juventude Popular não é apenas uma iniciativa de mau gosto político, mas todo um programa ideológico iliberal. Estes jovens populares, na verdade, são uns castiços.

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