Os resultados das últimas eleições vieram pôr a nu a crise
que atinge a direita em Portugal. A direita parlamentar vale neste momento
34,6% dos votos e 86 deputados, enquanto a esquerda parlamentar vale 53,3% dos
votos e 140 deputados. Isto coloca enormes desafios à direita democrática para
se aproximar do poder. Mesmo que o entendimento parlamentar das esquerdas tenha
acabado, nada garante que, em caso de necessidade, não volte a existir. A
direita para governar precisa de ter mais deputados que a esquerda. Estamos assim
num momento de crise e reconfiguração da direita. Vejamos alguns aspectos.
Comecemos com as novidades. O Chega alcançou o parlamento a
partir de algum rancor social, nomeadamente em zonas onde pode haver conflitos
com a comunidade cigana. Tem alguma margem de progressão fundada na exploração
do ressentimento social e caso se prolongue a crise da direita democrática. A
Iniciativa Liberal (IL) aproveitou o desencanto à direita e juntou uns quantos
órfãos das políticas de Passos Coelho. Pode herdar algum eleitorado jovem do
CDS e do PSD, caso este continue longe do poder. Seja como for, tem um programa
que não se acorda nem com a realidade do país nem com a tradição da direita
portuguesa. A margem de progressão parece curta e depende do que vier a
acontecer no PSD.
A crise que atinge o CDS é gravíssima. Não apenas perdeu
muito eleitorado como deixou de ser a única alternativa real aos descontentes
com o PSD. Tanto a IL como o Chega podem pescar nas águas onde o CDS pesca. Os
sectores mais ultramontanos podem encontrar no Chega a sua representação,
enquanto os mais liberais têm agora a IL ao dispor. Não se vislumbrando a
emergência de um líder carismático, estando o CDS acantonado num estrato social
muito específico e idiossincrático, as últimas eleições podem ter sido o ponto
de partida para o seu desaparecimento. Enfrenta uma ameaça real.
O caso mais interessante é o do PSD e a luta entre os
adeptos do passismo, representados por Luís Montenegro, e uma velha tradição da
direita portuguesa de carácter paternalista, com algumas preocupações sociais e
com alguns toques, não exagerados, de conservadorismo, encarnada por Rui Rio.
Se Montenegro ganhar o partido, este tenderá a ser mais liberal, o que poderá
liquidar a IL mas encolher o campo social do PSD. Se Rio se mantiver, teremos
um PSD menos liberal, mais na tradição de Cavaco Silva e mais próximo do centro
e da doutrina social da Igreja. Caso saia vitorioso no embate dentro do PSD,
não se pense que a esquerda recebe um bónus. Rui Rio, no parlamento e com a
aprendizagem feita, será, para António Costa, um osso duro de roer.
[A minha crónica em A Barca]
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