sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Rui Rio faz o seu caminho


Rui Rio tornou a vencer as eleições internas do PSD. Isso terá contrariado muita gente à direita, gente despeitada e ansiosa de que se retorne à política de punição das classes populares imposta por Passos Coelho. Rui Rio representa uma outra vertente do centro-direita. Nele não há ressentimento contra as classes populares, não se ilude com as fantasias dos putativos liberais portugueses e parece conhecer bem a estratificação do nosso tecido social. Tem outras virtudes. É autêntico, diz o que pensa e é capaz de enfrentar os poderes instalados, como se viu no Porto.

Certos sectores da direita – e também na esquerda, claro – acham-no um provinciano e uma personagem a fazer lembrar os tempos do Estado Novo. Será um provinciano, mas também um democrata convicto. Julgo que, apesar dos defeitos e limitações que possui, tem virtudes suficientes para dar um bom primeiro-ministro, que poderá introduzir um conjunto de rupturas importantes para o país, sem esfrangalhar o tecido social e sem devanear com as tontices liberais debitadas pelo grupo que rodeia o jornal Observador. Será liberal na economia, mas não tentará destruir os sindicatos nem o Estado social. Estará mais próximo de Angela Merkel do que de Margaret Thatcher.

Poderá derrotar a esquerda? Neste momento, a tarefa parece impossível. No entanto, a esquerda está mais frágil do que parece. É maioritária, mas não tem um projecto político comum. Mais do que isso, deixou de existir o temor da devastação social que Passos Coelho gerou em toda a esquerda e a uniu. Rui Rio está muito longe de assustar desse modo tanto o BE como o PCP. Por outro lado, a inconsistência, a arrogância e a falta de rumo do actual governo, com uma equipa ministerial fraca, tornar-se-ão, com o passar dos meses, cada vez mais óbvias. Os portugueses começarão a cansar-se de António Costa e a procurar uma alternativa.

Para chegar ao poder, Rui Rio precisa de sorte e de resolver três problemas. O primeiro é a criação de uma alternativa mobilizadora do país, tanto ao nível programático como no das pessoas com que se rodeará. Em segundo lugar, terá de unir o partido, sarar as feridas e curar as fracturas, o que o aroma do poder ajudará. Por fim, terá o problema mais complicado, o de ocupar o terreno da direita social que o estado comatoso do CDS está a deixar em aberto e que pode ser pasto para um partido como o Chega. Apesar da desvalorização que Rio tem feito das reais tendências antidemocráticas e iliberais do partido de André Ventura, seria uma vitória de Pirro ganhar as eleições e depender de gente como essa.

[A minha crónica no Jornal Torrejano]

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.