Mariana Mortágua anunciou que deixará o parlamento e não se
recandidatará à coordenação do Bloco de Esquerda (BE). O caso Mariana Mortágua
é interessante porque mostra que uma pessoa tecnicamente bem preparada não tem
de dar um bom líder. Mariana Mortágua foi uma deputada excelente. Competência
técnica e assertividade. Contudo, a sua liderança política foi um desastre. O BE
quase desapareceu do parlamento e está em vias de extinção. À sucessora de Catarina
Martins falta-lhe uma qualidade essencial: a empatia. Surge, aos olhos do
eleitorado, como distante, para não dizer arrogante. Falta-lhe também
maleabilidade para perceber as mutações sociais e para compreender que a agenda
política do seu partido já só atrai um núcleo muito restrito da população.
Mariana Mortágua passa de uma deputada brilhante a uma líder medíocre.
Ultrapassou o seu limite. Pagou, politicamente, caro.
É um facto que os tempos não estão de feição para a
esquerda, seja ela qual for. Os interesses do eleitorado deslocaram-se para
áreas em que a esquerda tem muita dificuldade em integrar na sua agenda. Os
eleitores estão, por um lado, mais individualistas e descrentes nas lutas
sociais; por outro, mais interessados numa afirmação identitária, deixando-se
cativar pelos discursos de exclusão dos que são diferentes, como os imigrantes.
Também a visão do mundo que, através das redes sociais, se tornou dominante, é
adversa para a esquerda. Tanto ao nível dos costumes, como da economia, as
perspectivas ideológicas e a interpretação do que deve ser a sociedade mudaram
radicalmente, estando parte substancial do eleitorado mais perto daquilo que é
defendido pela direita radical, do que daquilo que propõe a esquerda. Tudo isto
tornou a tarefa de Mariana Mortágua mais difícil, mas isso não explica a sua
incapacidade para lidar com a situação.
A substituição da actual líder por um outro porá fim à
agonia do BE? É duvidoso. O BE foi uma invenção genial para integrar no sistema
político nacional um conjunto de militantes da extrema-esquerda, que pretendiam
entrar no mainstream político sem passar pela desonra da deserção
da sua área e integração nos grandes partidos. Enquanto esses militantes, que
vinham dos anos 70, estiveram no activo, o BE, ajudado por uma comunicação
social simpática e por uma conjuntura política favorável, teve um desempenho político
e eleitoral interessante. Hoje, porém, nem a comunicação social é simpática
para o BE, nem a conjuntura lhe é favorável. Mariana Mortágua estava longe de
ser a líder ideal do BE, mas os tempos não auguram nada de bom para a futura
liderança.
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