Este estudo divulgado pelo Público levanta uma hipótese interessante. A crença religiosa decresce à medida que se afirma o pensamento analítico. A investigação está na linha de outras que mostram a crença religiosa ligada ao pensamento dito intuitivo. O jornal titula, como se fosse uma conclusão, que as raízes do ateísmo estariam no uso analítico da razão. Porventura, isso pode ser verdade. O uso do entendimento na análise tem o condão de dissecar a realidade, cindindo o todo em partes, construindo particularidades. Isso choca, claro, com a crença religiosa que é de carácter holístico.
Parece-me, no entanto, que o problema não está muito bem posto. Coloca a fé religiosa fundada em formas de pensamento, a forma analítica versus a forma intuitiva ou sintética. Nem vale a pena ir às várias tradições místicas e sapienciais da humanidade para contestar este ponto de vista. Basta recorrer a Kierkegaard, à sua concepção de fé como compromisso existencial com o Absoluto. A questão religiosa não está ligada, em primeiro lugar, ao pensamento, mas à existência, a um compromisso radical com uma dada forma de viver a vida e não tanto de a conceber intelectualmente. A raiz do ateísmo encontra-se nesse momento em que a fé religiosa deixa de ser um compromisso com a vida e o Absoluto e passa a ser uma questão de pensamento. De certa forma, as teologias - com as suas metodologias analíticas - já são formas de ateísmo ou, pelo menos, preparam o ateísmo.
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