A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu, proclamou, há dias,
a morte do modelo social europeu. Contrariamente ao que se faz crer, o modelo
social europeu não morreu de velhice ou de morte natural. Foi assassinado. Um verdadeiro
homicídio premeditado e preparado cuidadosamente ao longo de anos, mesmo de
décadas.
O modelo social europeu nasceu por dois motivos. Por um lado, para
recompensar as pessoas que combateram na II Guerra Mundial. Foi o resultado de
um acordo interclassista que mobilizou as populações para o esforço de guerra.
A saída do conflito e o plano Marshall exigiam paz social para relançamento da
economia. O preço do sacrifício em combate e as necessidades de reconstruir as sociedades
geraram uma procura política de equilíbrios sociais que se materializaram no
Estado Social.
Por outro lado, a ameaça do comunismo levou as elites económicas e
políticas à criação de uma sociedade de inclusão que afastasse as tentações,
nas classes trabalhadoras, de uma inclinação para o bolchevismo. O modelo
social europeu foi a arma usada pelo Ocidente, durante a Guerra Fria, contra o
bloco de leste. Uma arma de propaganda ideológica, a qual continha a liberdade
política, a prosperidade económica, a promessa de mobilidade social e de
reconhecimento do mérito. Uma arma eficaz.
Esquecida a guerra, relançada a economia, morto o comunismo, as elites
económicas descobrem que, ao liquidar o modelo social europeu, poderiam fazer
um negócio muito mais interessante para si mesmas. A abertura desregulada do
comércio mundial e a globalização foram a motivação e as armas para desfazerem
os equilíbrios herdados da II Guerra e da Guerra Fria. As pessoas já não
interessam, o equilíbrio e a moderação são mau negócio. Com tanta mão-de-obra,
quase escrava, disponível, estavam reunidas as condições para o assassinato do Estado
social. Este homicídio foi uma exigência das elites económicas ocidentais.
A execução foi levada a cabo, de forma contínua e sistemática, pelas
elites políticas. Subservientes, iníquas, decidiram trair a confiança dos
respectivos povos e destruíram, paulatinamente, o modelo social europeu. Este
homicídio político tem um sentido preciso. Significa que uma parte da população
vai morrer mais cedo, ter menos cuidados de saúde, ter acesso a menos emprego e
de pior qualidade, ter pior educação para os filhos, ter menos protecção no
desemprego, na doença e na velhice, em suma viver substancialmente pior. A
morte do estado social europeu foi um longo exercício de traição.
Obrigada pela clareza com que desmonta o projecto pantanoso destes comandantes da erosão. Como é habitual a sua leitura torna fluido o que se configura opaco e espesso.
ResponderEliminarMuito obrigado, Rita. Estamos num tempo em que é preciso ser claro, pelo menos em certas coisas.
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