sexta-feira, 13 de abril de 2012

Homicídio premeditado



Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu, proclamou, há dias, a morte do modelo social europeu. Contrariamente ao que se faz crer, o modelo social europeu não morreu de velhice ou de morte natural. Foi assassinado. Um verdadeiro homicídio premeditado e preparado cuidadosamente ao longo de anos, mesmo de décadas.

O modelo social europeu nasceu por dois motivos. Por um lado, para recompensar as pessoas que combateram na II Guerra Mundial. Foi o resultado de um acordo interclassista que mobilizou as populações para o esforço de guerra. A saída do conflito e o plano Marshall exigiam paz social para relançamento da economia. O preço do sacrifício em combate e as necessidades de reconstruir as sociedades geraram uma procura política de equilíbrios sociais que se materializaram no Estado Social.

Por outro lado, a ameaça do comunismo levou as elites económicas e políticas à criação de uma sociedade de inclusão que afastasse as tentações, nas classes trabalhadoras, de uma inclinação para o bolchevismo. O modelo social europeu foi a arma usada pelo Ocidente, durante a Guerra Fria, contra o bloco de leste. Uma arma de propaganda ideológica, a qual continha a liberdade política, a prosperidade económica, a promessa de mobilidade social e de reconhecimento do mérito. Uma arma eficaz.

Esquecida a guerra, relançada a economia, morto o comunismo, as elites económicas descobrem que, ao liquidar o modelo social europeu, poderiam fazer um negócio muito mais interessante para si mesmas. A abertura desregulada do comércio mundial e a globalização foram a motivação e as armas para desfazerem os equilíbrios herdados da II Guerra e da Guerra Fria. As pessoas já não interessam, o equilíbrio e a moderação são mau negócio. Com tanta mão-de-obra, quase escrava, disponível, estavam reunidas as condições para o assassinato do Estado social. Este homicídio foi uma exigência das elites económicas ocidentais.

A execução foi levada a cabo, de forma contínua e sistemática, pelas elites políticas. Subservientes, iníquas, decidiram trair a confiança dos respectivos povos e destruíram, paulatinamente, o modelo social europeu. Este homicídio político tem um sentido preciso. Significa que uma parte da população vai morrer mais cedo, ter menos cuidados de saúde, ter acesso a menos emprego e de pior qualidade, ter pior educação para os filhos, ter menos protecção no desemprego, na doença e na velhice, em suma viver substancialmente pior. A morte do estado social europeu foi um longo exercício de traição.

2 comentários:

  1. Obrigada pela clareza com que desmonta o projecto pantanoso destes comandantes da erosão. Como é habitual a sua leitura torna fluido o que se configura opaco e espesso.

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    1. Muito obrigado, Rita. Estamos num tempo em que é preciso ser claro, pelo menos em certas coisas.

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