A minha crónica semana no Jornal Torrejano.
A SIC, na passada segunda-feira, transmitiu um trabalho sobre o
abandono da Universidade por parte de alunos sem rendimentos. A reportagem é um
retrato fiel do país e dos profundos equívocos das políticas educativas
seguidas a partir dos anos noventa do século passado, senão mesmo antes.
Descobri que a justiça social em Portugal não decorre da responsabilidade
jurídica individual, mas de concepções metafísicas que definem as maldições
como hereditárias. Jovens estudantes, maiores de idade, cujos pais tenham
dívidas à segurança social não são ilegíveis para receber bolsa de estudo. Se a
Constituição da República não justificar este procedimento, certamente que a
Bíblia o fará: Deus, assim dizem, reserva
para os filhos o castigo do pai (Jó 21:19).
O pitoresco deste caso, todavia, não deve ofuscar o essencial da
reportagem. Há um processo de elitização social – não intelectual – da Universidade.
Jovens oriundos de famílias com poucos recursos terão cada vez mais dificuldade
em estudar. A restrição alarga-se às classes médias fustigadas pela crise e
pelas políticas governativas. O governo está a responder, através da selecção
económica e social, a um problema real, o da incapacidade do tecido empresarial
absorver os jovens com formação superior. Esta forma política de agir – iníqua
e preguiçosa – resolve um problema não pela compensação do mérito, mas pela
humilhação dos mais pobres e das classes médias em queda. Se o caminho da
Universidade for o da redução do número de alunos, a selecção destes deverá ser
feita apenas pelo mérito, havendo mecanismos sérios para ajudar estudantes sem
recursos. De fora, deverão ficar aqueles que manifestem menos capacidades para
o ensino superior e não os alunos pobres.
A iniquidade política do processo tem outra face. Muitos dos cursos
existentes são absolutamente irrelevantes do ponto de vista profissional e
cultural. Foram o resultado de
estratégias seguidas pelas instituições de ensino superior para captar
alunos e sustentar os seus corpos docentes. A maioria dos alunos da reportagem
da SIC frequentava cursos deste tipo. Se os recursos públicos são escassos, o
Estado deveria ter há muito estabelecido regras muito rigorosas no
reconhecimento de cursos e no número de vagas. Demitiu-se. Muito gente sabia
que uma catástrofe se aproximava, mas a irresponsabilidade política deixou o
processo decorrer até ao descalabro actual: licenciados sem trabalho e alunos
sem dinheiro para estudar.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.