Aquilo a que estamos a assistir no mundo ocidental, com a
erosão das democracias liberais, a ascensão do populismo de extrema-direita, a
fabricação, através dos algoritmos das redes sociais, de uma cultura de ódio,
de conflitualidade e de negação do outro, tudo isso traz consigo a marca da
descristianização que atingiu o Ocidente. É certo que uma parte dos políticos
da extrema-direita já se afastou abertamente do cristianismo, tal como no
século XX fascismo e nazismo eram, abertamente, anticristãos. Outra parte,
contudo, continua a reivindicar-se como cristã, não hesitando em utilizar a
religião como forma de propaganda política, enquanto defende abertamente
posições que estão em confronto violento com os valores originais trazidos por
Cristo.
Vejamos – apenas como exemplo – o alvo preferencial da
extrema-direita um pouco por todo o lado: o imigrante, o estrangeiro. Será que
um cristão poderá subscrever as políticas que a América de Trump impõe, ou
aquelas que os pequenos Trumps europeus pretendem impor? A resposta encontra-se
no evangelho de Lucas, capítulo 10, versículos 25 a 37, a parábola do bom
samaritano. A resposta de Jesus ao doutor da lei, do ponto de vista político, é
interessante porque, podendo escolher como símbolo do amor ao próximo uma
qualquer pessoa da comunidade judaica, escolheu um samaritano, visto pelos
judeus como estrangeiro e particularmente desprezível. Jesus não mandou os
samaritanos para a sua terra, mas escolheu um para simbolizar a conduta
misericordiosa que todos devemos ter com o nosso próximo.
Isto não significa, do ponto de vista político, que os
países devem ter as portas escancaradas, mas que há um dever de não tratar mal
aqueles que vêm fazer o que os ocidentais não querem ou não conseguem fazer. Só
num clima de profunda descristianização é possível ver as políticas de Trump ou
os cartazes que André Ventura espalhou pelo país. Só nesse clima se pode
perceber o ódio que é destilado nas redes sociais por apoiantes da
extrema-direita. Só perante uma completa perda de influência dos valores fundamentais
do cristianismo se pode entender a derrocada civilizacional a que assistimos.
Estamos em época natalícia, mas o Natal está afogado no consumo sem fim e é, a
cada hora, negado pela intolerância de uma nova elite de políticos extremistas
que, apesar de alguns dos seus líderes encherem a boca com Deus, não hesitaria em
mandar crucificar aquele cujo nascimento o Natal pretende reviver.
Apesar de tudo, um Bom Natal e um Feliz Ano Novo. Há sempre
um princípio de esperança que nos deve orientar, mesmo na noite mais escura.
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