A minha crónica em A Barca.
Olhamos para um campeonato do mundo de futebol e percebemos,
de imediato, uma das causas dos problemas políticos que atingem o projecto
europeu. O campeonato do mundo é um hino ao Estado-Nação. As selecções
representam os Estados-Nação e recebem um inequívoco apoio popular. As pessoas
sentem-se representadas pela sua selecção, vibram por ela, alegram-se com as
suas vitórias e sofrem com os seus desaires. A causa principal não reside no
facto de serem equipas de futebol mas de serem selecções nacionais. Um
campeonato do mundo é uma manifestação global de um nacionalismo soft.
Em nome do nacionalismo cometeram-se atrocidades sem fim. No
entanto, os Estados-Nação permitiram a evolução dos regimes políticos nacionais
para democracias representativas. Substituíram a ideia de superioridade da
nação, de um patriotismo como último refúgio dos canalhas, como dizia Samuel
Johnson, pelo patriotismo constitucional, fundamento de um Estado democrático e
de direito, como defende Jürgen Habermas. Se há um nacionalismo perigoso, onde
o pior do homem pode vir ao de cima com facilidade, há também um virtuoso, que
faz depender a vida política da lei e da liberdade.
Uma das marcas fundamentais dos países que fundaram a União
Europeia (UE) – e daqueles que, posteriormente, aderiram ao projecto europeu –
é serem exemplos do patriotismo constitucional. São Estados-Nação, regulados
pela lei e com regimes democráticos. O problema é que, a partir de determinada
altura, dentro da UE, se sonhou com o fim dos Estados-Nação europeus e se
começou a socavar os seus alicerces. Não foi um jogo claro e limpo. Pelo
contrário. Foi acção obscura, feita nas costas dos eleitorados pelas elites
políticas que, com a ajuda de alguns meios universitários, tentaram vender a
narrativa de que a destruição do Estado-Nação seria inexorável e um passo para
o paraíso.
O resultado deste desvario tem sido catastrófico. O sinal
mais claro foi o Brexit, e o
crescimento da extrema-direita nacionalista tornou-se uma moda que chegou já ao
poder em vários países europeus, começando a destruir os fundamentos
constitucionais das democracias. Um campeonato do mundo de futebol é sempre uma
manifestação do peso que o Estado-Nação tem no coração das massas populares. Se
esse coração não for cultivado por uma ordem nacional constitucional e democrática,
então o desvelo com que vemos as massas populares a apoiar as suas selecções
nacionais transferir-se-á para o pior dos nacionalismos que começam a pulular
por todo o continente.
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