Este democratismo das redes sociais, ao dar força a
movimentos como os acima referidos, veio revelar o carácter aristocrático do
conhecimento científico. Este é produzido e compreendido por uma elite, um
clube seleccionado que, para entrar nele, exige longos anos de preparação e um
conjunto não pequeno de provas ao longo do caminho. Isto significa que a maior
parte de nós – quase todos – não está habilitado para trabalhar em ciência, e
mesmo aqueles que estão, estão apenas num ramo muito específico. O que acontecia,
antes das redes sociais invadirem o panorama da intercomunicação humana, era
que havia um respeito tácito, veiculado pela comunicação social e pelos valores
da sociedade, pelos esforços desses homens e mulheres que dedicavam uma vida ao
conhecimento. Presumia-se – e com razão – que sendo especialistas, tinham uma
autoridade real para falar sobre a sua área, fossem vacinas, cancro de pele, ou
física nuclear.
O que se assiste é uma revolta da plebe – ou dos sans-culottes,
caso se prefira a França da Revolução ao Império Romano – contra o patriciado
ou a aristocracia do conhecimento científico. A revolta tem uma característica
específica. Não apenas pretende ter voz sobre assuntos de natureza científica,
como quer ter o poder da autoridade: as suas crenças, sem qualquer validação,
são a verdade e a ciência, com o seu laborioso e controlado processo de
produção de conhecimento, não passa de uma mistificação. Estamos a assistir a
um teste terrível dos efeitos da liberdade de expressão. Até que ponto a
ciência e o conhecimento racional podem sobreviver a estes ataques irracionais?
Não é apenas ao nível político, com a erosão das democracias, que as redes
sociais geram problemas. Também são um factor de turbulência para a ciência e
para os benefícios que os seres humanos podem tirar dela. Já não é impossível
pensar que uma nova Idade das Trevas esteja no horizonte.
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