quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

Eutanásia, moral e política

Pablo Picasso, La muerte de Casagemas, 1901

Do ponto de vista moral, se defendermos uma posição que respeite a autonomia das pessoas e a sua capacidade de escolherem aquilo que apenas a elas diz respeito, julgo que o único caminho possível é o da legalização da eutanásia. No entanto, a questão não é moral ou apenas moral. É política e aqui há problemas de natureza constitucional. Os artigos 24.º e 25.º da Constituição não me parece que dêem respaldo a que se autorize alguém a praticar eutanásia em terceiros. Julgo haver interpretações conflituais de especialistas constitucionais. Será no terreno da interpretação da Constituição que tudo se irá resolver.

O ponto 1 do art.º 24 diz o seguinte: "A vida humana é inviolável." O ponto 1 do art.º 25 diz: "A integridade moral e física das pessoas é inviolável." Ambos os pontos surgem como incondicionais. Vejo com dificuldade que se possa fazer uma interpretação condicional desses pontos de modo a que se defendesse, por exemplo, "A vida humana é inviolável, a não ser que...". Isto tem dois problemas. Não é o que está na Constituição e, segundo, tornava a inviolabilidade da vida humana condicional.

Uma linha de argumentação política a favor da eutanásia seria argumentar que em certos estados degradados da existência a vida de um ser humano deixa de ser uma vida humana. Sendo assim, aquele que aplica a eutanásia não está a violar uma vida humana. No entanto, julgo que isso cria muitos problemas adicionais. Por exemplo, qual o momento em que uma vida humana deixaria de ser humana e passaria a ser apenas vida? Simpatizo moralmente com a ideia de que as pessoas possam escolher a sua morte (tenho aqui menos dúvidas morais do que na questão do aborto). No entanto, o problema político é muito espinhoso e a política tem aqui preeminência sobre a moral.

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