segunda-feira, 3 de maio de 2021

47 anos de regime democrático


No dia 25 de Abril, passaram 47 anos da queda da ditadura de Salazar e Caetano. O novo regime nasceu com um problema que, no momento da libertação, não foi claramente notado. Faltava-lhe uma direita. Se olharmos para a Europa Latina, encontramos, em Itália e França, tanto a direita como a esquerda na resistência a regimes ignominiosos. Em Espanha o caso é diferente. Foi a direita franquista que assegurou a transição à democracia. Nestes países, a direita tinha uma legitimidade democrática que ombreava com a esquerda. Em Portugal, um país severamente despolitizado pela ditadura, a direita estava – com honrosas excepções – com o regime deposto. A queda da ditadura, o entusiasmo popular, a emergência das grandes figuras oposicionistas à luz do dia, tudo isso foi motivo de dor e de temor para a direita.

No entanto, o 25 de Abril de 1974 foi uma oportunidade para o nascimento de uma direita democrática em Portugal. Em torno de Sá Carneiro e de Freitas do Amaral, emergiu uma nova e democrática direita, que trouxe para a política nacional as perspectivas ideológicas, políticas, sociais e económicas das direitas democráticas europeias. Esta substituição da velha direita apoiante da ditadura pela nova direita foi uma das mais valiosas conquistas de Abril. No plano político não foi a única, pois também, com o desenrolar dos acontecimentos e a perda de ilusões, a esquerda revolucionária tornou-se democrática e parlamentar. O 25 de Abril foi o ponto de partida para uma aprendizagem geral da vivência política da democracia. Só então, os portugueses começaram a aprender o que era viver num regime marcado pelo pluralismo e pela concorrência.

Do ponto de vista político, qual o grande desafio que hoje se coloca ao regime saído do 25 de Abril? O grande desafio é evitar a radicalização e a transformação do combate político numa guerra de seitas. Há, em parte da sociedade, uma espécie de rancor à democracia e um desejo de confrontação, de transformação da vida política numa guerra entre nós e eles. Essa parte encontrou hoje a sua representação política histriónica. De momento, é minoritária. Contudo, os efeitos devastadores da pandemia por que estamos a passar podem criar uma situação social propícia a uma radicalização de novos sectores. A melhor forma de continuarmos a comemorar o 25 de Abril é, à esquerda e à direita, evitar radicalizações, evitar o corte de pontes com o outro lado, evitar que os cantos de sereia dos inimigos da democracia se façam ouvir com os seus tambores de guerra.

[A minha crónica em A Barca, de Maio]

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