Um dos danos
colaterais da guerra na Ucrânia aconteceu na esquerda do sistema partidário
português. O bombardeamento caiu em cima do Partido Comunista e muitos
estilhaços atingiram o Bloco de Esquerda, apesar de ter sido mais lesto e
competente em distanciar-se da invasão russa. A guerra na Ucrânia está a ser
sentida de forma muito traumática pelas opiniões públicas europeias. Há nessas
reacções várias coisas. A estupefacção pela invasão de um país europeu por outro,
a brutalidade da intervenção, a incompreensão das razões que assistem aos
russos, a percepção de que estes se tornaram um perigo para segurança da Europa.
No caso português, também a simpatia que os imigrantes ucranianos geraram no
convívio com os portugueses.
Até à Queda do Muro de Berlim, essa esquerda viveu na crença de que havia um mundo melhor do que aquele em que vivemos. Fosse a União Soviética, a China maoísta ou a Albânia. O mundo ocidental – democrático e liberal – era aquilo que deveria ser destruído, trocado por outros mundos inspirados nas revoluções comunistas. Com o fim dos regimes de leste, muitas pessoas compreenderam que aqueles eram altamente ineficientes, corruptos e opressivos. Compreenderam que não havia qualquer mundo melhor que pudesse ser trazido por uma revolução. Os europeus sentiram que viviam no melhor dos mundos possíveis, um mundo mais eficiente, menos corrupto e muito mais livre. Esse mundo é o que é defendido pela NATO, pelos EUA e pela União Europeia, com todos os defeitos e perversões que se conhecem.
Foi o ataque frontal a este mundo pelo PCP e, embora de modo mais dissimulado, pelo BE que fez desabar sobre eles uma tempestade. Estes partidos continuam a viver na ilusão de uma alternativa às democracias liberais. Crêem que as forças que impedem o advento desse admirável mundo novo são a NATO, os EUA e a União Europeia. Em tempos normais, com excepção das pessoas mais politizadas, ninguém se preocuparia com estas crenças. Num momento altamente traumático como o actual, a opinião pública revoltou-se e não compreendeu a posição perante a Rússia ou os ataques ao Ocidente. Na verdade, existem alternativas à democracia liberal. Na Rússia, na China, na Arábia Saudita, no Irão, na Venezuela, na Turquia, na Coreia do Norte, em Cuba, etc. Alguém estará interessado em viver nesses regimes? As democracias liberais não são perfeitas. Longe disso, mas são o melhor que a humanidade conseguiu imaginar para assegurar uma vida em sociedade decente. Do ponto de vista moral, qualquer alternativa é pior, muito pior.
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