Carlos Botelho, Lisboa, 1946 (aqui) |
O fragor da madeira fresca para
a cidade
os homens traziam e em
apertadas ruas abriam
com langor avaras passagens.
A estreita senda, onde na manhã
de ontem,
os eléctricos esculpiam, no
frio da estrada,
imensas, pois amarelas e vivas,
as paisagens.
Os pregões, tal ainda dado
ouvir me foi, ali
a voz calaram e as ruas, ora
desertas,
habita-as gente, fantasmas
ondulantes,
pássaros suados, a bramar por
nós, chamam.
Quando gaivotas, poisam de asas
abertas
ou, se rouxinóis, cantam, a voz
incerta.
Nas sombras da tarde não há
mistério
e pelos cafés bóiam turistas,
gente obscura,
despojos vindos das terras
perdidas do império.
Quando as águas correm, a
cidade grita,
e no céu, como raparigas
suspensas,
transbordam de cinza nuvens
varadas de mágoa.
O Sol, em leve inclinação, ao
meio-dia deixa,
entre casas, um risco de cal e
calor.
As árvores agachadas, pois
árvores são,
fazem lembrar, em funesta
analogia,
o cantar sobressaltado de uma
cotovia
presa no silêncio de um homem pelo
chão.
(2006)
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