sábado, 25 de maio de 2019

Da persistência dos lugares

Charles Marville, Rue Vieille-Notre-Dame (de la rue du Pont-aux-biches), 1864-66

A fotografia de Charles Marville tem mais de 150 anos e, no entanto, aquela paisagem urbana ainda me foi familiar. Não em Paris, mas em muitas cidades e vilas portuguesas. O mesmo tipo de ruas, o mesmo género de casas, a mesma sensação de imobilidade do tempo. Sabemos, pela razão, que o calendário passa uniformemente pelos diversos lugares habitados pelo homem. A experiência, porém, desmente esse saber. Há lugares em que o passado persiste, escorado numa obstinação contra a natureza devoradora do tempo. Nesses lugares, o grande devorador é obrigado à ficção da imobilidade. Os dias e os meses passam, mas as folhas do calendário são rasgadas com uma lentidão tal que ninguém percebe o anacronismo em que vive. O espaço humano é uma revolta contra o tempo.

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