Jorge Carreira Maia - Templo de Diana, Évora (2008)
No fim da Idade Média - se é que existiu uma Idade Média -, naquele tempo que é agora conhecido como Renascimento, desenvolveu-se o culto pelos testemunhos da época clássica greco-latina. Foram tempos de busca de um ideal que permitisse confrontar a realidade do presente. Este interesse pelos ideais clássicos foi, posteriormente, suplantado pelo fascínio com os tempos modernos, e os testemunhos do passado tornaram-se lugares para o exercício melancólico da memória, de uma memória vagamente colorida pela etiqueta cultura. As pessoas cultas, suspeita-se ou suspeitava-se, tinham interesse pelo passado e coleccionavam visitas às múltiplas e diversas ruínas que o tempo não conseguira ainda destruir.
Esta estranha melancolia, porém, talvez seja sintoma de uma outra coisa. As ruínas clássicas são metáforas que permitem o ambíguo exercício de ver a ruína que está diante dos olhos e evitar ser confrontado por ela. O que move os homens para este culto da ruína pode ser a experiência insuportável da ruína que o próprio presente traz consigo. Diante dos nossos olhos, as instituições desfazem-se, os modos de vida alteram-se drasticamente e os valores sofrem mutações inopinadas. Aquilo que ainda há uns anos seria impensável tornou-se lugar comum. Não são apenas os centros das cidades que caem. À nossa volta, o efeito do tempo tornou-se avassalador, arrastando na sua voracidade tudo aquilo que parecia ser sólido. O culto das ruínas representa o olhar fascinado e, ao mesmo tempo em pânico, de alguém que pressente a dissolução do seu modo de vida, mas que não tem a força suficiente para o suportar. Olha, como se não olhasse, para o destino do seu próprio mundo.
Esse culto prolonga-se ao longo do século XVIII e XIX, os Românticos retomam-no e alguns exacerbam-no, dando origem ao romance gótico...que se ramifica até hoje.Contudo, o culto das ruínas não venera destroços e vestígios a partir da I Guerra Mundial...Ninguém se emocionaria num estado de exaltação perante aldeias ou cidades destruídas recentemente. Têm de ter alguns séculos de distanciação...há algo de intempral nas ruínas dos grandes templos da Anguidade. Não nos transmitem finitude mas intemporalidade...
ResponderEliminarOs romântico recuperam o imaginário medieval. Mas o que me interessa, neste caso, é essa dicotomia: o sentimento de exaltação perante ruínas antigas e a incapacidade de exaltação perante a ruína do presente. Parece um duplo processo psicanalítico, recalcamento e sublimação.
EliminarAs ruínas da antiguidade foram sendo preservadas e constituem-se como fontes históricas. Não magoam, bem pelo contrário, seduzem.
ResponderEliminarAs ruínas modernas não servem de culto, são destruídas enquanto ruínas, agridem em permanência a nossa memória recente.
Boa semana
Abraço
As nossas ruínas assustam-nos, mas aquilo que as origina não é diferente daquilo que originou aquelas a quem a nossa memória preta tributo e comemoração.
EliminarBoa semana
Abraço
Talvez já conheça o trabalho deste fotógrafo
ResponderEliminarhttp://ruinarte.blogspot.pt/
As ruínas recentes guardam ainda os sons de quando eram organismos vivos, por isso nos perturbam, a nossa memória consegue reconstituir o tempo antes da ruína, as ruínas da antiguidade são habitadas por um silêncio diferente, para as reavivarmos temos que recorrer mais à imaginação do que à memória,
Não conheço o blogue. Agradeço a referência. De resto, estou de acordo. As ruínas recentes apelam à memória, as outras são imaginadas. São tradições imaginárias.
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