A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
No primeiro dia de trabalho do novo parlamento europeu, quase 200
deputados eucépticos e de extrema-direita (cerca de um quarto do parlamento),
aos primeiros acordes do hino da União Europeia (UE), levantaram-se e voltaram
as costas ao centro do hemiciclo. Eis um acto político de enorme valor
simbólico e sintoma do mal-estar que fervilha nas entranhas da UE. As causas
deste mal-estar são múltiplas e variam conforme os países. Podemos, no entanto,
sublinhar três.
Em primeiro lugar, o recuo do Estado social, a desregulação dos
mercados, a erosão dos direitos do mundo do trabalho. A UE tem-se mostrado
impotente para conciliar a globalização da economia com elevados índices de
protecção social, os quais tinham permitido, na Europa, o crescimento da classe
média. O empobrecimento das classes médias tem-se mostrado irreversível e
gerador de animosidade em relação à UE.
Uma segunda causa prende-se com a divisão entre o norte protestante e
o sul católico. Apesar de uma raiz comum, catolicismo e protestantismo geraram
culturas éticas, sociais e políticas diferentes. Esta forma distinta de
organizar as sociedades acabou por gerar choques e desconfianças entre o norte
o sul da Europa. Em período de crise, estas desconfianças tornam-se mais
activas e dão lugar a visões isolacionistas e de recuperação de tradições
nacionais imaginárias.
A terceira causa está ligada ao problema da imigração e,
fundamentalmente, à presença, em certos países da Europa, de comunidades
muçulmanas muito activas e afirmativas dos seus valores. Observe-se a polémica
em Espanha à volta das pretensões do emirato do Qatar em transformar a Praça de
Touros de Barcelona numa Mesquita. Começa a emergir, em vários países europeus,
um efectivo receio das pretensões dominadoras de certos grupos ligados ao
Islão, conduzindo os eleitores à presunção de que o isolamento fora da UE será
mais eficaz na afirmação dos valores culturais nacionais e na defesa perante a
crescente presença do islamismo.
Estas são as grandes preocupações dos eleitores europeus, mesmo de muitos que votam nos partidos ligados ao
consenso europeu. Qualquer uma destas temáticas é, todavia, ignorada pelas
acção política da União Europeia. O temor da pobreza, a desconfiança relativamente
aos outros europeus e o medo do Islão não são assuntos nobres – são incómodos e,
por vezes, tocados mesmo pelo racismo – que mobilizem a elite europeia, mais
interessada nos negócios e nas desregulações da vida económica e financeira. É
natural que os europeus se comecem a voltar para aqueles que voltam as costas a
uma UE lunática e servil da plutocracia.
É natural que os europeus se voltem para as oposições à UE, mas estas são diferentes entre si e,. creio eu, trata-se apenas de uma aliança de conjuntura.
ResponderEliminarOs eurocépticos serão xenófobos, mas não anti-semitas -latu senso- e estão distantes do racismo da extrema-direita que, este sim, engloba árabes e judeus no mesmo pacote e. mais tarde ou mais cedo, vai ter (se não tem já) Israel à perna, a substituir-se às plutocracias irresponsáveis..
Desse ponto de vista a situação não me parece tão dramática. Já no que diz respeito às condições sociais. Aí sim, o problema é muito complicado.
Um abraço
Seja como for, há um sentimento de ruína que a tudo parece tocar. Não sei se haverá forças para suster a queda do edifício.
EliminarAbraço