Tristan Murail - L'Esprit des Dunes (Ensemble Intercontemporain)
Por estranho que possa parecer, gosto da música do compositor francês
Tristan Murail. Isso não é, contudo, sinal de qualquer elevação espiritual, ou
de uma extraordinária predisposição intelectual ou, mesmo, de um refinamento do
gosto. É antes sintoma da minha desagregação mental, da dilaceração do
pensamento, da guerra civil que me percorre o cérebro e lança neurónios contra
neurónios, hemisfério contra hemisfério. Começo assim por ouvir a anunciação do
anjo da guerra e os exércitos entram em acção. A terra arde e todas as
sensações que nascem em mim são estilhaços de vidro e fragmentos de granadas.
Ao longe, oiço trovões. Como o mundo, tudo em mim se cinde. Tento sintonizar o
ouvido na música e uma volúpia de cinza e fogo arrasta-me para fora do silêncio
da noite. A madrugada ainda não é um risco no horizonte, apenas dois sóis se
chocam no interior da galáxia, talvez o meu cérebro, dirão. (averomundo: a prosa dos dias, 2008-12-13)
A música contemporânea nem sempre é acessível, mas com o texto a servir de suporte foi agradável ouvir.
ResponderEliminarUm abraço
Muitas vezes pergunto-me sobre o destino desta música contemporânea. Como irá o futuro tratá-la. Ela parece-nos tão estranha quanto, em outros tempos, os compositores hoje reconhecidos soavam estranhos.
EliminarAbraço
O que me agrada na música contemporânea, de vanguarda, é a forma como explora a dicotomia silêncio/som. Para mim é mais difícil ouvir uma peça barroca para cravo do que um solo de órgão de Messiaen ou as Sonatas e Interlúdios para Piano Preparado de John Cage.
ResponderEliminarO que diria Chopin ao ouvir um Piano Preparado?
;)
Eu tenho essa experiência não tanto com a música mas com a filosofia. Durante muito tempo era-me muito mais penoso ler um autor da antiguidade clássica do que um autor contemporâneo, Havia qualquer coisa da experiência daqueles tempos que eu não conseguia reproduzir. É uma questão de adequação ao espírito do tempo.
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