A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
Decididamente estou a ficar velho, demasiado velho e a configuração do
mundo é cada vez mais estranha para mim. Isto é desusado, pois sempre estive
aberto a novas visões do mundo, a inovadoras opções estéticas, a compreender a irrupção
do não acontecido no curso normal das coisas. Talvez seja da minha educação,
uma educação recebida ainda no tempo do salazarismo, com uma forte componente
católica, talvez seja apenas uma questão de estética social, mas há coisas,
insignificantes para a maioria das pessoas, que, aos meus olhos, tornam claro
que algo está podre.
Isto vem a propósito do discurso de Passos Coelho perante os deputados
do seu partido. A determinada altura, certamente embalado com a sua
genialidade, o primeiro-ministro afirma: “que se lixem as eleições, o que
interessa é Portugal”. Eu percebo o que ele quer dizer. Está a passar uma
mensagem de propaganda partidária ao país: “Vejam como eu sou patriota, e tão
patriota que nem me preocupo de perder eleições para ser um salvador da pátria”.
E com isto, lá no íntimo, o primeiro-ministro tem a esperança que o reconheçam
como herói e o tornem a eleger. Esta propaganda barata não me incomoda, faz
parte do ofício dos políticos, e qualquer outro tentaria dizer coisa
semelhante.
Também não é o falso desprezo pelas eleições que me causa desconforto.
Passos Coelho vive dos resultados eleitorais, e para ele, diga o que disser, o
mais importante são os resultados eleitorais. O que acho incompreensível é o
“lixem” utilizado pelo primeiro-ministro perante deputados eleitos da nação.
Não sou puritano, mas sou muito sensível ao uso da linguagem e acho inaceitável
a utilização deste tipo de plebeísmo, a roçar o calão, por alguém que é o
principal responsável do país. Que as pessoas falem como querem na sua vida
privada, é uma questão de liberdade e bom-gosto pessoais. Quem dirige uma
nação, quem representa um povo, quem tem os destinos de uma comunidade em suas
mãos, não se pode comportar como uma rapazeco a dizer graçolas e palavras
brejeiras.
Eu sei que os portugueses perdoam este tipo de coisas e até acham
muita graça (a expressão, com o “lixem” incluído, foi calculada para ter
impacto eleitoral). Mas este tipo de acontecimento, que aparenta não ter
importância, revela muito do pântano a que se chegou. Na sua pouca importância
é, para quem é observador atento das subtilezas da vida pública, mais revelador
da degradação das instituições do que o triste e lamentável episódio da
licenciatura de Miguel Relvas. Enfim, estou velho e isto causa-me náuseas.
Li num jornal, que este performer, que nos saiu das urnas, terá participado em tempos num casting no Teatro Politeama.
ResponderEliminarNão sei se foi ou não seleccionado, mas não tenho dúvidas de que dava um "compére" razoável numa revista brejeira do La Féria...
Abraço
Sim, teatro de revista parece-me algo digno da personagem. Mas o que tudo isto demonstra é que a nossa vida política não passa de uma revista no Politeama. Na verdade, o nível político a que se chegou não é o o D. Maria ou da ópera do S. Carlos, mas do Parque Mayer (sem desprimor para estes).
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