Extinção é o nome de um romance de Thomas Bernhard, um dos autores de
que mais gosto. Confesso que, ao escolher o título para esta crónica, hesitei
bastante entre Extinção e Perturbação, nome de outro romance do autor. Esta
hesitação deve-se ao sentimento de estranheza pelo desenrolar dos
acontecimentos em Portugal. Um sentimento de desagregação das instituições
cresce todos os dias, apodera-se das pessoas, cai como uma sombra sobre a vida
social e transforma em ruína tudo em que toca. O mal parece ter tomado conta do
destino do país.
O escândalo da contratação dos enfermeiros – aliás semelhante ao
escândalo dos professores pagos pelas câmaras para desenvolverem actividades de
enriquecimento curricular e semelhante àquele que se prepara silenciosamente
para os médicos – é apenas mais um sintoma da desagregação da moral social, de
uma moral que permitia um pacto entre os portugueses e a consequente vida
pacífica em sociedade. Aproveitando o memorando da troika, as elites dirigentes não hesitam um segundo em humilhar as
pessoas, em desapossá-las de um mínimo de dignidade, em reduzi-las a puro lixo.
Ao mesmo tempo, assiste-se a uma terrível atracção, entre a classe
política, pelas licenciaturas miraculosas, obtidas segundo critérios certamente
legais, mas que aos olhos da opinião pública estão longe de merecer dignidade
moral. Pode somar-se ainda o sintoma de abandono que parte substancial do país
sente e, ao mesmo tempo, a desfaçatez e a impunidade de uma classe política
venal que fala grosso com os fracos e os desapossados e se mostra subserviente
com os lobos que devoram o rebanho. Isto causa perturbação.
Mas a perturbação é apenas sintoma de outra coisa, de uma doença que
atinge o corpo social e que está a destruir as instituições democráticas. As metástases
da corrupção, do compadrio, do favorecimento de alguns em detrimento do bem
comum, da venalidade, da incompetência (veja-se como o primeiro-ministro e o
ministro das finanças, esse incensado mago da economia, se enganaram nas previsões que fizeram), da mais pura irrelevância
crescem rapidamente e tomam conta do país, corrompem moralmente os hábitos e os
juízos do cidadão comum, abrem feridas dolorosas por todo lado.
São essas feridas que começam a gangrenar e que deitam um cheiro
pestilento por toda a parte. O regime democrático está em estertor. Para
destruir a democracia em Portugal, não é preciso recorrer aos extremistas.
Basta entregar, como o fizemos, o país aos partidos do arco da governação. Eles
encarregam-se, sem pestanejar, de o fazer. O mal cresce e tudo parece estar em
extinção.
Por entre o estertor daquilo que se pensava ser democracia e nunca o foi a não ser mero simulacro, ouvem-se murmúrios de revolta, em toda a parte. Ainda hoje os algarvios consideraram Passos Coelho e o PR como persona non grata. Não há membro do governo que não seja vaiado vá onde for...o sofrimento aumenta, com ele a revolta, que já não se manifesta apenas em comentários...Não houve um século em que não houvesse uma revolta em Portugal. Há limites que não podem se rultrapassados, por muita paciência que estas gentes tenham.
ResponderEliminarUma deterioração enorme da situação política. A agravar tudo isto, a desprezo com que Cavaco Silva é olhado pela população. O que nunca aconteceu com um PR até hoje.
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