Parece existir um fenómeno de atracção entre os jovens – fundamentalmente, do sexo masculino – pelo Chega. Estamos perante uma radicalização política de parte das novas gerações. O que as mobiliza é o extremismo das propostas, a contestação do outro, a oposição à igualdade das mulheres (um aspecto relevante na radicalização dos rapazes), o questionar das instituições democráticas e da própria democracia liberal, a coreografia e os rituais políticos, a continua transformação de adversários políticos em inimigos. Pertenço a uma geração que, na sua juventude, há cinquenta anos, se radicalizou politicamente, defendeu utopias e soluções políticas que, se aplicadas, seriam tenebrosas, como serão tenebrosas as soluções políticas da extrema-direita. Haverá entre ambas as radicalizações alguma diferença?
Há uma diferença moral acentuada. Os motivos da radicalização são muito distintos. A radicalização da minha geração foi feita em nome de um mundo melhor, onde as injustiças não tivessem lugar. Foi feita em nome da emancipação das pessoas, da igualdade da mulher, do direito dos povos à sua autodeterminação, da abolição do peso que a classe social de origem tinha no destino de cada um. As nossas soluções eram más, odiosas, como viemos a descobrir, mas aquilo que nos levava à acção política era ainda uma reverberação da moral cristã, na qual muitos de nós, apesar de ateus na época, tínhamos sido educados. Procurávamos o bem da comunidade, não o nosso próprio bem. Tínhamos a ilusão de poder construir o céu na terra. Havia em nós um impulso metafísico para criar um mundo onde o mal fosse abolido.
Quando olhamos para as causas da extrema-direita, causas que seduzem tantos jovens, percebemos o grau de decadência a que chegou a influência da moral cristã. Por muito que os dirigentes do Chega vão à missa e se benzam, o que defendem está em profunda contradição com essa moral. Não é por acaso que o actual Papa é odiado em muitos sectores da extrema-direita. A atitude perante os imigrantes, o racismo latente, ou manifesto, no discurso, o ódio ao outro, um machismo mais ou menos manifesto, a tentativa sistemática de enlamear os actores políticos de outras áreas, o apelo a um nacionalismo perigoso, a negação daquilo que na nossa história há de obscuro e humilhante para os outros, tudo isto são causas moralmente inaceitáveis. São causas que deveriam envergonhar as pessoas, mas que as mobilizam. Esta é a grande diferença entre o radicalismo das duas gerações de jovens radicais. A primeira era má pelas suas consequências, mas não pelas suas intenções. A actual é má também pelas suas intenções. E isso é muito preocupante.
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