A minha crónica quinzenal no Jornal Torrejano.
A humilhação a que o governo grego foi submetido pelos membros do
Eurogrupo, com a Alemanha à cabeça, traz consigo duas lições fundamentais.
Comecemos pelo lado do Syriza. Toda a gente que acompanha a vida política e a
vida económica sabia duas coisas. Em primeiro lugar, que o Syriza tinha um
programa social-democrata e que, apesar da origem política dos seus dirigentes
e militantes, não havia nele vestígios de radicalismo revolucionário. Em segundo
lugar, desde os alemães, passando pelo FMI e pela instituições europeias, todos
sabiam que o Syriza tinha razão relativamente ao problema da dívida. Varoufakis
contou, depois da sua demissão, que, nas reuniões, lhe chegaram a olhar nos
olhos e dizer: tem razão no que está a
dizer, mas vamos esmagar-vos na mesma.
A principal crítica a fazer ao governo grego não é a de ter capitulado. A
principal crítica centra-se em ter confundido o poder da razão com a razão do
poder. O Syriza não errou na análise económica, errou na análise política.
Pensou que, através de uma argumentação sólida, poderia convencer quem não
estava interessado em ser convencido. A única preocupação das instituições
europeias foi a de impedir uma solução do problema grego vinda de fora da
direita ou, no pior dos cenários, dos socialistas. E o Syriza deveria saber
disso desde que chegou ao poder. O Syriza confundiu política com moral e
arrastou, na sua queda, as expectativas dos gregos e as pretensões de toda a
esquerda europeia que não se revê nas posições dos socialistas.
A segunda lição vem do lado dos vencedores, do lado do senhor Schäuble e
dos dezoito governos que o apoiaram na liquidação da Primavera grega. A política, mesmo na versão democrática, não é o
lugar nem da verdade nem da moralidade. O que está em jogo é o poder, e sempre
que a verdade e a moral fazem perigar o poder, os políticos escolhem o poder, e
fazem-no sem contemplações. Mesmo que isso implique liquidar a soberania de um
povo (foi o que aconteceu com os gregos), mesmo que isso implique opções
económicas absurdas e que, de forma reiterada, mostraram que não funcionam,
mesmo que isso implique destruir o velho projecto europeu e transformá-lo no diktat da principal potência económica,
a Alemanha.
A destruição de um governo democraticamente eleito teve como finalidade
mostrar que a democracia deixou de existir na União Europeia. Uma segunda
consequência foi tornar evidente que só a vontade e os interesses alemães
contam. O corolário, um corolário paradoxal, extrai-se facilmente: os países
europeus aceitaram perder a sua soberania, levados pela retórica do fim do
Estado-Nação, para que um Estado-Nação, a Alemanha, reforçasse a sua soberania
por cima dos despojos dos outros. A vida é o que é, e a política é o lugar onde
a vida se manifesta na sua máxima potência.
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