A minha crónica quinzenal no Jornal Torrejano.
Não sei qual vai ser o destino da Grécia e da própria União Europeia. Escrevo
na segunda-feira. Quando o Jornal Torrejano sair já muita água terá passado por
baixo das pontes. As leituras do referendo, com algumas excepções, são o
resultado do posicionamento ideológico daquele que as faz. Pessoas de direita
tendem a amaldiçoar o Syriza, as de
esquerda vêem no acontecimento uma extraordinária vitória. Eu não sei, repito,
o que o voto dos gregos vai trazer a todos nós. Quero, porém, falar sobre a
estupidez, pois muito do que se está a viver é efeito de uma estupidez
persistente, contumaz.
A estupidez começa com o facto de a intransigência da União Europeia
ter feito cair quatro governos gregos (de centro direita (2), de centro
esquerda e de tecnocratas) antes de chegar o Syriza. Foi a União Europeia que, não compreendendo o verdadeiro
problema grego (a corrupção e a inexistência de um Estado central devidamente
organizado e funcional), alimentou o Syriza,
e o fez passar de um pequeno partido de 4% ou 5% de votos para o partido
maioritário na Grécia. A estupidez continuou quando, em vez de aproveitar alguém
não comprometido com a corrupção, fez tudo para derrubar mais um governo. Um
desporto de estúpidos.
A estupidez continua com o desprezo da situação geopolítica da Grécia.
Os credores, em todo este processo, visaram humilhar o governo e os governantes
gregos, esquecendo que se está numa zona muito difícil na qual confluem os maus
ares dos Balcãs – com a Turquia tão perto –, do Mediterrâneo e da Ucrânia. São
os credores (de uma dívida cuja natureza está muito mal esclarecida) que, com a
sua intransigência, estão a empurrar a Grécia para fora da sua natural aliança
ocidental. Ainda não percebi se a senhora Merkel quer na Grécia uma guerra
civil ou que ela se torne aliada da Rússia e da China.
O que mais me marcou, todavia, foi o ambiente na Praça Syntagma, na
noite em que o Não venceu o referendo. Era um ambiente que parecia o de uma
revolução, o do fim de uma ditadura. Marcou-me não por aquilo que o leitor pode
estar a pensar. Marcou-me, mais uma vez, pela estupidez das políticas
europeias. Como é possível que a Europa das liberdades, a Europa que apadrinhou
a libertação dos países do sul das respectivas ditaduras, que incentivou os do
Leste a libertarem-se, que comemorou esfusiante a Queda do Muro de Berlim, como
é possível que essa Europa se tenha tornado, aos olhos de muitos europeus, o
símbolo da opressão. Como é que a estupidez política, o fanatismo provocado
pela ideologia e a subserviência ao dinheiro conseguiram transformar o espaço
do sonho da liberdade no pesadelo de um campo de concentração?
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.