Markus Luepertz - Fuego (2001)
Nesta semana consumou-se a grande tentação que, desde o
desastre de Pedrógão Grande, flutuava nos corações da direita. A princípio, alguma
sensatez política evitou que os partidos na oposição fizessem da desgraça um
móbil do combate político. Por certo, não o fizeram por decoro nem por uma
superioridade ética, coisas que, na verdade, não são essenciais na política,
sejam quais forem os protagonistas. Fizeram-no porque isso era, politicamente,
muito arriscado. O eleitorado poderia penalizar esse tipo de conduta.
No entanto, a direita não comprometida com um partido, aquela que se move nos
órgãos de comunicação, nos blogues e nas redes sociais – a direita com voz mas
que não vai a votos – exultava e via no acontecimento de Pedrógão a oportunidade para
tentar liquidar António Costa. Isso aconteceu praticamente desde o primeiro
momento. A direita política, porém, hesitava entre a sensatez estratégica e o
desejo que lhe corroía o coração. O sinal dessa hesitação foi dado de forma
muito clara pela história dos suicídios protagonizada por Passos Coelho.
Não foi uma gaffe ou um engano. Foi
um acto falhado no sentido freudiano da expressão.
Contudo, perante a incapacidade de encontrar uma política alternativa credível, o
desejo foi mais forte do que a sensatez. Obscurecida pela vontade de vingança,
a direita política tornou-se incapaz de distinguir entre o sentimento das
pessoas e o coro ruidoso dessa direita que vive da comunicação e das redes sociais, uma direita
que, por não ter que prestar contas a eleitores e fazer-se eleger, não disfarça
o profundo ódio que a habita, um ódio cujo principal destinatário é António
Costa. A triste história da lista de mortos e o patético ultimato do chefe da
bancada parlamentar do PSD foram a expressão dessa confusão, foram a expressão
de que o desejo falara mais alto do que o cálculo político e estratégico.
Esmagada pelos resultados da economia, desmentida nas suas
patéticas previsões de desgraça, essa direita não hesitará perante nada para
lançar o país no caos. E, como vimos, não se pode esperar, nos dias que correm,
da direita política alguma sensatez. Aliás, o PSD na oposição é, por norma, um
partido muito pouca responsável e pouco interessado no bem da comunidade. Se a
esquerda – todos os três partidos – não estiver atenta a este sentimento de
ódio e não antecipar, a cada momento, para onde ele dirige o ressentimento, irá,
em vez de governar, perder muito do seu tempo e da sua energia a consertar
estragos. Não estamos em tempo de amadorismos, pois o adversário está de cabeça perdida.
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