quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

Ciência e pensamento crítico


Foi para a Ciência que se viraram as esperanças quando se precisou, desesperadamente, de uma vacina para a COVID-19. Ao mesmo tempo que as expectativas se voltavam para ela, crescia no mundo uma contestação – mais ou menos dissimulada, mais ou menos violenta – dessa mesma Ciência, dos seus resultados e das teorias que ela disponibiliza para melhorar o conhecimento humano sobre a realidade e, a partir desse conhecimento, encontrar soluções para os problemas com que nos defrontamos.

Uma das formas mais insidiosas de superstição é aquela que se baseia num suposto pensamento crítico ou no direito de pensar por si mesmo, numa espécie de afirmação à outrance do lema kantiano ‘Pensar sempre por si mesmo’. A estratégia é colocar em pé de igualdade uma forma de conhecimento altamente estruturada, obedecendo a rigorosos protocolos de controlo, testagem e avaliação, isto é, a Ciência, com opiniões e conjecturas que não têm qualquer controlo. Aliás, nem se trata de colocar em pé de igualdade Ciência e estas opiniões. Pretende-se mesmo julgar a Ciência com base nessas opiniões, como se isso fosse uma atitude crítica altamente inteligente.

Não temos o dever de pensar por nós próprios? Temos, mas pensar por si próprio, de modo responsável, é avaliar, com base num método rigoroso, aquilo que nos é proposto. Isso, dir-se-á, levanta um enorme problema. Por exemplo, como posso avaliar se devo ou não ser vacinado contra a COVID-19? Não tenho conhecimento para fazer uma avaliação crítica da vacinação. Como eu está mais de 99% da humanidade. A única coisa que podemos fazer, para pensar criticamente, é confiar na autoridade científica dos cientistas. Não se trata, porém, de uma aceitação cega de uma autoridade. Há regras para aceitar argumentos de autoridade. São essas regras que permitem adoptar uma atitude crítica sobre certo assunto que não dominamos.

Só devemos aceitar um argumento de autoridade se aqueles que o propõem são efectivamente autoridades no assunto, se não existirem contra-exemplos credíveis que ponham em causa o que a autoridade afirma e se existir um forte consenso científico sobre esse assunto, por exemplo, sobre o benefício da vacinação. Ora, quando as pessoas, em nome de um suposto pensamento crítico e de um direito a pensar por si, rejeitam os resultados da Ciência, não estão a pensar criticamente. Estão a submeter-se à autoridade de pessoas que não dominam os assuntos, que emitem opiniões que ninguém controla nem avalia. Estão a trocar o conselho de autoridades competentes por crenças sem qualquer fundamento. Escolhem a superstição e não o pensamento crítico.

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