Bernardo Marques, Campo - Alentejo (Gulbenkian) |
Terra
amarela, suja de sangue e poeira,
cariada
nos interstícios dos campos.
O
verde dos sobreiros,
a
cortiça devorada pela água do dia.
Avistam-se
rios de alcatrão.
Degolam
o silêncio da planície,
o
trémulo cantar das aves.
Sonhava
vestir de cotim cinzento
e
cavalgar pelos campos,
cheirar
o aroma das horas,
ouvir
a dor inscrita na espádua ferida.
Quão
perto me aproximei,
com
olhos puídos de luz,
da
substância da terra,
do
segredo na raiz do mundo?
A
planície era página em branco
aberta
à caligrafia do lavrador,
ao
ronco hostil da máquina.
Escrita
nua, indecifrável,
um
código invertido na sombra do céu,
um
labor arcaico ferido pela noite,
um
rosto aberto ao sopro da morte.
Os
olhos do viajante são portas
abertas
ao amarelo da campina,
às
mulheres ensanguentadas pela sombra.
A
planície clama pela cinza do Outono,
o
chão devora as cearas
e
o segredo da mão que escreve
abre-se
na terra amarela, suja de saibro,
ao
temor da noite na fímbria da aurora.
1993
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