terça-feira, 20 de maio de 2025

Abandonados pelo voto popular

Camille Pissarro, Fiesta en la ermita, 1878

Um dos dados mais importantes das eleições de domingo foi o abandono da esquerda pelo voto popular. Os resultados são aterradores para os partidos tradicionais de esquerda. Não apenas porque, no conjunto, estão reduzidos no número de deputados – 68 em 230, mas porque o eleitorado que os abandonou muito dificilmente retornará. Parte substancial do eleitorado do Chega (isto já tinha acontecido nas eleições do ano passado) vem da esquerda. São pessoas que estão revoltadas com a sua situação social e cansaram-se tanto do reformismo socialista como da retórica revolucionária do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda.

Não querem saber de transformações colectivas, nem da luta dos trabalhadores ou das minorias. O centro do seu interesse político é a sua vida. Votaram no partido que imaginam dar corpo à sua revolta. É uma esperança do desespero. Imaginaram, durante muito tempo, que seria a política de esquerda que levaria o Estado a resolver os seus problemas. Como o Estado é impotente para o fazer, pois cada um depende de si mesmo, mudaram não o modo de pensar, mas o sentido de voto. Tornam a imaginar que um partido ou o seu líder lhes resolverá o problema. É uma ilusão que levará tempo a ser desfeita.

E enquanto a ilusão popular no salvífico messias se não desfizer, a esquerda fica confinada a um eleitorado da classe média, um eleitorado educado, elitista, mas que não é suficiente para a fazer retornar ao poder. Perder parte substancial do voto popular é uma derrota muito mais grave para a esquerda do que o miserável número de assentos parlamentares que obteve. Pode ser o sintoma de uma doença crónica muito grave, que se arrastará no tempo, mas que pode não encontrar solução.

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