Arpad Szenes - Niño con cometa (1935)
Devo a Carles Álvarez Garriga, no seu Prólogo a Classes de Literatura, de Julio Cortázar,
o conhecimento da fórmula do especialista absoluto, cuja autoria pertence a
Alfonso Reyes. Na verdade, é uma bela fórmula. Refiro-me à sua aparência
estética. Ei-la: ∞/0. Ela dá-nos a ideia reguladora – ou o ideal, se
preferirem – do especialista. O processo de especialização, um imperativo da
busca da eficácia do conhecimento, intensifica-se em todas as áreas, incluindo
as da Filosofia e da Literatura. Refiro-me às praxis universitárias, mas não só.
Os especialistas sabem cada vez mais de cada vez menos. Se universitários, produzem
uma montanha de informação sobre o mais ínfimo grão de areia.
O que significa então, neste contexto, a fórmula? Ela
diz-nos que o ideal que regula toda a actividade de conhecimento é a de um saber
infinito sobre absolutamente nada. Estamos longe do lamento husserliano sobre a
crise do fundamento das ciências. Estamos perante a consumação, na área do
saber, do niilismo anunciado por Nietzsche. O ideal que regula, hoje em dia, a
actividade universitária aproxima-se de um saber infinito sobre coisa nenhuma.
Se isso é pouco visível nas áreas das ciências da natureza, devido às
aplicações técnicas que o conhecimento especializado proporciona, parece evidente
nas áreas das humanidades, onde a Universidade é um dispositivo de produção de
lixo cognitivo, lixo esse que exige uma grande dedicação, perseverança e
capacidade de trabalho, diga-se.
A ironia de ∞/0
visa tornar patente um problema que assombra a orientação do saber na
modernidade. Esse problema é o da ruptura entre saber e sabedoria. O saber
sobre um dado objecto de estudo acaba por afunilar a compreensão que se tem do
mundo e do homem. Hoje em dia, possuir um conhecimento sólido, na ambiência
universitária ou em qualquer outra, nada nos diz sobre a capacidade de
compreender a realidade em que se vive ou quem se é. O homem moderno desenvolveu
essa profunda capacidade de ter muito conhecimento sem, na verdade, deixar de
ser uma espécie de adolescente retardado, sem ter qualquer sabedoria. Talvez
fosse esse o destino do homem ocidental, descendente dos gregos, como não
deixou de o registar Platão na palavra do sacerdote egípcio (Timeu, 22b): “Ó
Sólon, Sólon, vós, Gregos, sois todos umas crianças; não há um grego que seja
velho”.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.