Há acontecimentos que têm um efeito revelador da natureza de
certas posições políticas. A actual pandemia é um desses casos. O que teria
acontecido aos portugueses se o país tivesse seguido aquilo que certos grupos
sociais e políticos advogam relativamente à privatização da saúde e da
educação? Esta pergunta deveria assombrar, como se fora um fantasma, cada um de
nós. A resposta dada pelos profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi
extraordinária. O próprio SNS mostrou uma inesperada resiliência, apesar de há
muitos anos, sob o fogo de um radicalismo liberalizante, estar a ser desgastado
e de haver nele um investimento cada vez mais parcimonioso. Também o sistema
educativo público português e os seus profissionais deram uma resposta que
merece ser sublinhada, ao reinventar-se de um momento para o outro.
O radicalismo liberalizante que sopra tanto de fora como de
dentro do país teve, nesta terrível experiência, uma das suas maiores derrotas.
Tanto no Serviço Nacional de Saúde como no sistema público de educação, os seus
profissionais mostraram aquilo que verdadeiramente os move, apesar das
campanhas que sobre eles regularmente se abatem. O serviço público. A ideia de
serviço público tem sido alvo, desde há décadas, de ataques ferozes,
desvalorizando quem abraça uma carreira que não conduzirá nem à glória nem à
riqueza. Quando a comunidade precisou, de uma forma ainda mais urgente e
difícil, daqueles que a servem, os corpos profissionais disseram presente. Os
da saúde arriscando a vida para salvar os seus pacientes. Os da educação
descobrindo, de um dia para o outro, um caminho para que as novas gerações
continuassem a aprender.
O espírito liberal e o liberalismo não são um mal. Precisamos
de pessoas mais livres, mais autónomas e responsáveis. Precisamos de uma
economia concorrencial, menos dependente do Estado e mais do mercado. O
liberalismo torna-se um mal quando se radicaliza e quer destruir o serviço
público, quer entregar áreas tão importantes como a saúde ou a educação apenas
nas mãos dos interesses privados. O liberalismo é um mal quando corta com a
dimensão social e o espírito comunitário. Se há alguma coisa a aprender no
contexto desta pandemia é a inultrapassável importância do serviço público.
Esperemos que a lição seja aprendida e que um largo consenso, da direita à
esquerda, se estabeleça na defesa de um serviço público de grande qualidade, e
não meramente assistencial, tanto na saúde como na educação.
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