Não creio que a pandemia que se vive abra as portas para um
mundo novo. Duvido mesmo que o essencial, passada a fase de maior dificuldade,
seja apreendido. E esse essencial não está no futuro, mas no passado, num
conjunto de decisões políticas que foram tomadas, ao longo de décadas, sob
pressão de uma ideologia radical que tenta impor à política as regras do
mercado. Havia um número mais que suficiente de alertas para a possibilidade de
emergir uma crise pandémica. Instituições de tipo diverso – ligadas à saúde, à
espionagem e à política – vinham alertando os Estados e as elites políticas
para que podia acontecer aquilo que está a acontecer.
Ninguém quis saber ou os que quiseram, como Obama, foram
cilindrados. Quando os políticos dizem que ninguém estava preparado, deveriam
dizer que ninguém quis preparar-se. Por outro lado, mas em consonância com
isto, temos assistido nas últimas décadas, por decisão política imposta por uma
visão radical do liberalismo, a uma destruição paulatina dos serviços públicos
de saúde, à sua descapitalização e à perda de capacidade de resposta aos
problemas de saúde das comunidades. Demasiado caros, argumenta-se numa lógica mercantil.
A ignorância propositada de um perigo anunciado e a desmontagem dos serviços
públicos de saúde configuram, ao nível político, uma grave infracção da regra
da prudência que deve orientar os que comandam os Estados.
A partir do século XIX, com um incremento contínuo, a
política, no mundo ocidental, foi-se submetendo à economia e o Estado ao
mercado. Esta inversão no comando das sociedades tem um preço, o qual estamos
agora a pagar. O mercado é o lugar do risco. As empresas, na concorrência entre
elas, correm riscos. Este é um factor decisivo na competição. Os Estados, porque
são dispositivos criados para a segurança das pessoas, devem evitar o risco e
orientar-se pela prudência.
A submissão da política à economia, como acontece nas nossas
sociedades, não é apenas uma inversão da tradição política ocidental, nascida na
antiguidade clássica greco-romana, mas a subversão da própria função do Estado,
que se torna incapaz de prever o perigo e de se dotar de mecanismos de defesa
das populações, apostando no risco, com a esperança de que as ameaças nunca se
concretizem. O que está longe de ser uma realidade, como estamos a descobrir
nestes dias. Seria, todavia, iludimo-nos crer que esta pandemia irá ensinar aos
que comandam os destinos das comunidades que a política se deve separar dos
imperativos da economia e que a prudência, não o risco, é a atitude fundamental
do homem político.
De etapa em etapa o capitalismo faz tudo para se autodestruir e vai consegui-lo.
ResponderEliminarUm abraço
O principal problema é que não compreende que a função e o tempo do Estado não são os mesmos do que os dos mercados. Depois, a coisa corre mal.
EliminarAbraço
Oxalá que com o desconfinamento as coisas não piorem. Oxalá que não...
ResponderEliminar.
Tenha um dia feliz
Esperemos que não.
EliminarUm resto de bom dia.