O interessante na situação de Biden reside no caso da tentativa de levar até ao fim a recandidatura se inscrever já no plano da incapacidade de avaliar a própria situação, pois os recursos intelectuais e a base neuronal encontram-se, muito provavelmente, de tal maneira afectados que não conseguem realizar um processo de auto-análise com o mínimo de espírito crítico. No primeiro ensaio da tradução portuguesa de “Ensaios Sobre a Virtude & a Felicidade”, de Samuel Johnson, o autor escreve: “Túlio observou há muito que nenhum homem, por mais enfraquecido que esteja pelo tempo que já viveu, está ciente da sua própria decrepitude a ponto de supor que poderá não conservar o seu lugar no mundo por mais um ano”. Ao ensaio foi dado o nome de Esperança Vã. Parece haver na fragilidade dos homens não uma força para a ultrapassar, mas um poder de criar ilusões sobre o seu próprio estado.
Joe Biden estava já preso a essa ilusão e era através dela que via não
apenas o seu futuro, como o mundo. Ele não sai pela porta pequena, mas sai pela
porta da fragilidade, a qual não lhe permitiu perceber a real situação em que
se encontra. O mais espantoso, porém, é que ainda foi possível fazer-lhe compreender
que era o momento de renunciar à esperança vã que alimentava. Esta experiência
é muito mais comum do que se pensa e todos estamos sujeitos a ela. Quando se
trata de um assunto privado, como a resistência a aceitar que chegou o momento
de ir para um lar, o drama é circunscrito. Quando, porém, se trata da direcção
da maior potência mundial e que o destino do mundo democrático pode estar em
jogo, o drama pode tornar-se em tragédia. E na tragédia, ao contrário do que
pensa Marques Mendes, há grandeza na derrota do herói.
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