quarta-feira, 31 de julho de 2024

Cânticos lunares (iv)

Edvard Munch, Claro de luna, 1895

Grassa a noite na flecha do silêncio.

A mão seca curva-se

ao trabalho nocturno do astro.

Preso ao centro da árvore,

um braço vegetal ergue-se

para a escassa poeira das ruas.

A Lua é uma flor plantada no deserto,

o cacto preso no firmamento,

luz evaporada no silvo da Terra.

 

Vai o satélite em seu caminho,

toca o azul no coração dos homens,

abre as horas inocentes da manhã

às asas febris do tempo.

Um insecto, urdido no fogo,

vem pela sombra lunar,

cera e seda no suplício da cidade.

Sob a copa do coração,

a Lua desenha paisagens de pavor.

 

Preso à leveza do archote,

o senhor da terra ergue o dia

no vitríolo da voz.

Lavra o vento no esquecimento lunar,

conta os olhos dos homens,

as pálpebras acariciando o fogo,

o suor enluarado da face.

Um comércio de luz vende luas

nas pétalas perdidas de uma rosa.

 

Maio de 1993

[Conjunto de cinco poemas pertencentes à série Cânticos da Terra Amarela]


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