David de Almeida, Lua, 1999 (Gulbenkian) |
Ilumina a Terra a Lua Nova.
Os segredos presos ao depósito
das horas gastas
na rasura das ruas.
A voz dos gatos na noite,
telhados abertos à visitação,
à súplica feroz dos anos,
aos dias de júbilo.
Sob o candelabro lunar,
holocaustos, hecatombes,
o propiciatório desejo de luz,
fogo orgânico no peito.
Quando a noite se manifesta,
vem uma víscera delgada,
ponto de vista informe,
a mágoa sem nome do mundo.
A Lua, em paciente trabalho,
inunda a cabeça, debrua
a língua pelo som das sílabas,
ergue-se na sintaxe do rancor.
As crianças aprendem
o valor fátuo da noite,
a escuridão viva do medo,
o húmus no carvão dos campos.
O silêncio ecoa ferido
pela queda da parra,
pelo crepitar da macieira,
os dedos embutidos na garganta.
Em toda a Terra é noite.
Uma escuridão de cães a latir,
a faca presa na mão,
a cega luz na cegueira da Lua.
Abril de 1993
[Conjunto de cinco poemas pertencentes à série Cânticos da Terra Amarela]
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